O governo brasileiro está se preparando para lançar nas próximas semanas as bases de um novo leilão do setor elétrico que ajudará a filtrar o enorme estoque de projetos de geração de energia renovável que se formou no último ano, após empreendedores correrem contra o tempo para garantir descontos em tarifas de distribuição e transmissão.
A licitação em novo formato, que deverá ocorrer em 2023, prevê colocar geradores para competir pela conexão de suas usinas ao sistema de transmissão de energia elétrica, disse o Ministério de Minas e Energia (MME) à Reuters.
A ideia é selecionar os projetos que efetivamente serão construídos entre os quase 200 gigawatts (GW) de potência que aguardam outorga. Esses empreendimentos, que “no papel” dobram a capacidade de geração do país, foram impulsionados pelos descontos tarifários que elevam a sua competitividade.
O ministério disse que trabalha na abertura de uma consulta pública sobre o assunto “nas próximas semanas”, com previsão de publicação de uma portaria para o final do ano.
“O tema tem sido tratado com prioridade no ministério. A elaboração da portaria visa estabelecer um critério de competição que proporcione maior eficácia e eficiência na alocação dos recursos de transmissão, cujo acesso… tem se caracterizado como um recurso escasso”, disse a pasta, em nota.
Por isso a importância do leilão, que trará mais clareza sobre a expansão futura do parque gerador à agência reguladora, ao planejador do sistema elétrico e também aos próprios empreendedores.
A proposta do leilão começou a ser gestada em meio à corrida dos geradores após a lei 14.120, que levou a uma disparada dos pedidos de outorga –o prazo para que novos projetos tentassem garantir a extensão dos descontos nas tarifas de distribuição e transmissão (Tusd e Tust) terminou em março.
Porém o tema avançou pouco até agora, sem que a dinâmica e diretrizes para essa competição tenham sido definidas. Enquanto isso, geradores convivem com uma demora incomum na concessão de outorgas na Aneel, o que trava o desenvolvimento de novas usinas renováveis.
Com o mercado livre passando a comandar a expansão da geração de energia no Brasil nos últimos anos, tornou-se mais difícil para o governo prever o ritmo de crescimento da oferta e planejar a transmissão –por isso, a conexão das usinas ao sistema interligado passou a se tornar cada vez mais disputada.
Não há informações sobre quantos gigawatts de potência poderiam ser viabilizados a partir do leilão.
Visão dos geradores
A ideia de um novo leilão para organizar a fila de usinas renováveis é bem vista entre os geradores, que enfrentam um mercado cada vez mais competitivo para viabilizar seus empreendimentos.
A avaliação dos agentes é que os critérios atuais para as usinas acessarem a rede elétrica não são mais adequados. Hoje, a emissão de pareceres de acesso pelo operador ONS segue uma ordem cronológica da data de solicitação –ou seja, quem chega primeiro tem preferência, de forma que projetos “de papel” podem estar à frente de outros que realmente poderiam ser construídos.
“Entendemos que é muito importante algum processo competitivo para diferenciar os projetos”, avaliou Carlos Dornellas, diretor da Associação Brasileira de Energia Solar Fotovoltaica (Absolar).
“O que nós temos dúvida é sobre a solução proposta… Defendemos algo mais simples, o leilão nos pareceu algo muito complexo”, acrescentou Dornellas.
Uma opção, segundo ele, seria pedir que os projetos solares –que representam a grande maioria do estoque atual– aportassem garantia financeira, o que indicaria uma “firmeza” por parte do empreendedor na construção da usina.
Já Elbia Gannoum, presidente da Associação Brasileira de Energia Eólica (ABEEólica), vê com bons olhos a ideia do leilão, mas entende que o próprio mercado se encarregará de selecionar os bons projetos.
“A solução tende a acontecer naturalmente, mesmo que não se mude o mecanismo de margem de escoamento”, afirma.
“A tendência é que essa bolha de projetos se dissipe à medida que a gente se distancie do desconto das tarifas Tusd e Tust… Aí vamos voltar para a normalidade, projetos pedindo outorga com preço cheio, num ritmo normal”.
Atraso nas outorgas
O “filtro” para os projetos também ajudaria a organizar o processo de concessão das outorgas por parte da Aneel, que vem se mostrando demorado neste ano, segundo a Omega Energia.
Bernardo Bezerra, diretor de Inovação, Produtos e Regulatório da Omega, afirmou à Reuters que a morosidade do lado do regulador tem sido um dificultador para novos projetos renováveis, mais até do que a alta dos preços dos equipamentos eólicos e solares.
Segundo ele, pedidos de outorga da empresa que foram realizados até março deste ano ainda não tiveram encaminhamento na Aneel. Tipicamente, o prazo para se obter outorga era de três a quatro meses.
Questionada, a Aneel disse que tem sido eficiente na instrução e emissão de outorgas, embora reconheça que houve um grande aumento dos pedidos em função da mudança regulatória.
Entre o final de 2021 e início deste ano, foram protocolados cerca de 4.000 pedidos de outorgas para novas usinas, quase o dobro das outorgas que já foram efetivamente emitidas nos últimos sete anos, disse a Aneel. Neste ano, até meados de outubro, a agência emitiu 989 outorgas.
Fonte: Reuters
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