Em 1893, o cientista franco-alemão Rudolf Diesel patenteava um motor de combustão interna, que não necessitava de centelhamento para que o combustível entrasse em ignição.
Diesel utilizou óleo de amendoim como combustível para o motor por ele inventado. O uso de óleo vegetal era a opção àquela época, pois somente anos mais tarde a indústria do petróleo passaria a produzir uma corrente de hidrocarbonetos que viria a se tornar a mais utilizada para movimentar o motor criado por Diesel.
Não tardou para que o próprio combustível viesse a se chamar “óleo diesel” — caso do Brasil. Uma referência ao “pai” do motor onde por puro efeito de compressão é que ocorre a combustão e a energia química é transformada em energia mecânica.
Em vários países, a denominação mais comum é chamar de “gasóleo” o combustível utilizado em motores Diesel.
A transição energética vai aos poucos trazendo novos produtos, nomes e siglas para o ciclo diesel.
Os variados termos utilizados para os combustíveis utilizados podem gerar dúvidas sobre o que realmente é determinado combustível.
Diesel verde é o mesmo que biodiesel? E o diesel renovável, do que se trata?
Isto posto, vale uma breve descrição sobre cada um dos tipos de “diesel” rodoviário comercializados no Brasil e os que estão chegando ao mercado, como forma de contribuir com a discussão e elucidar o significado dos termos utilizados.
Que diesel é esse?
Óleo diesel A: o combustível derivado de petróleo produzido nas refinarias, nas centrais de matérias-primas petroquímicas e nos formuladores, destinado a veículos dotados de motores do ciclo Diesel, de uso rodoviário, sem adição de biodiesel. É um combustível destinado à formulação de diesel B no Brasil.
Óleo Diesel B: o óleo diesel A que contém biodiesel (B100) adicionado no teor estabelecido pelas regras vigentes.
A mistura do diesel A com o B100 normalmente ocorre nas distribuidoras de combustível. As características de qualidade do Diesel A e B são especificadas na resolução ANP 50/2013. É este diesel que o consumidor encontra nos postos revendedores.
Biodiesel: segundo a ANP (RANP 45/2014), biodiesel é um “combustível composto de alquil ésteres de ácidos carboxílicos de cadeia longa, produzido a partir da transesterificação e/ou esterificação de matérias graxas, de gorduras de origem vegetal ou animal”.
Traduzindo o “quimiquês”, de forma simplificada, o biodiesel é obtido pela reação de óleos ou gorduras com um álcool (metanol é o mais comum).
Ao sair da usina, ele é denominado como biodiesel B100, que será misturado posteriormente com óleo diesel A, na formulação do Diesel B, podendo ser utilizado também em outras aplicações.
Misturas de biodiesel: uma mistura de biodiesel B100 com óleo diesel mineral, é designada BXX, onde XX representa a porcentagem em volume de combustível biodiesel na mistura. Assim, um diesel B10 é aquele que tem 10% de Biodiesel (B100) na sua composição.
Um detalhe interessante em relação ao Biodiesel no Brasil é que a Lei 11.097/05, que dispõe sobre a introdução do biodiesel na matriz energética brasileira, no seu artigo 6º, o define como “biocombustível derivado de biomassa renovável para uso em motores a combustão interna com ignição por compressão ou, conforme regulamento, para geração de outro tipo de energia, que possa substituir parcial ou totalmente combustíveis de origem fóssil”.
Observa-se que a lei propõe um conceito amplo para biodiesel, de forma que qualquer biocombustível derivado de biomassa utilizado em motores de ciclo diesel pode ser considerado um biodiesel. A resolução da ANP, contudo, restringe o termo (para éster de esterificação ou transesterificação).
Diesel verde ou diesel renovável: o diesel renovável ou verde é um diesel parafínico, obtido de matéria prima renovável, adequado aos motores que trabalham no ciclo diesel.
Quando se compara as especificações mundiais, existem algumas diferenças nos processos ou matérias primas que podem ser considerados para a produção do diesel renovável.
Por exemplo, a norma europeia, EN-15940, considera os produtos obtidos pelo hidrotamento de óleos ou gorduras ou via gás pela síntese.
Nessa norma, a única limitação para a origem do CO2 e do hidrogênio é que seja renovável, ou seja, pode ser obtido tanto de biomassa quanto pela captura de CO2 do ar com hidrogênio proveniente de eletrólise da água.
No Brasil, a Resolução ANP 842 de 2021 inclui cinco opções de tecnologia de produção do diesel verde. Entretanto, limita a rota via gás de síntese à matéria prima obtida a partir de biomassa.
HVO (Hydrotreated Vegetable Oil ou óleo vegetal hidrotratado): O HVO é o tipo de diesel verde ou diesel renovável mais produzido no mundo, sendo o terceiro mais consumido (atrás do etanol e do biodiesel) e aquele cuja produção mais cresce no mundo (incluindo o etanol e o biodiesel nessa comparação).
Esse crescimento é explicado pelo menor custo do produto em relação às demais rotas; pelo maior desenvolvimento tecnológico; e pela excelente qualidade do produto, tornando-o adequado às mais modernas tecnologias veiculares.
Pode-se dizer que todo HVO é um diesel verde, mas nem todo diesel verde é um HVO, porque ele pode justamente ser produzido por outras rotas tecnológicas.
Como o diesel verde ou diesel renovável é quimicamente semelhante ao diesel de petróleo, ele pode ser usado em sua forma pura — chamada R100 — como um combustível drop-in (que não requer alteração na logística ou motores para sua utilização); ou pode ser misturado com diesel de petróleo ou com biodiesel em variadas proporções.
As misturas de diesel verde e diesel de petróleo são rotuladas com um R seguido pela porcentagem (por volume) do teor de diesel verde.
Por exemplo, uma mistura de 20% de diesel verde e 80% de diesel de petróleo é chamada de diesel R20. Uma mistura de 10% de biodiesel, 10% de diesel verde e 80% de diesel de petróleo é chamada de diesel B10R10.
O Diesel R da Petrobras: é um diesel exclusivo da companhia, que contém uma parcela de diesel verde (HVO) na sua composição.
Ele hoje é produzido na Refinaria Presidente Getúlio Vargas (REPAR), em Araucária (PR), por coprocessamento de óleo diesel mineral com óleo vegetal em uma unidade de hidrotratamento (HDT).
Na REPAR, atualmente, esse Diesel R pode ser produzido com teores que variam de 5% a 10% de HVO na composição ao sair da refinaria, ou seja, teores que variam de diesel R5 a diesel R10.
Outros projetos de coprocessamento e produção de diesel R estão sendo desenvolvidos no Brasil. Há projetos para as refinarias de Cubatão (RPBC), Paulínia (REPLAN) e Duque de Caxias (REDUC).
Importante pontuar que, pela legislação atualmente vigente no país, o diesel R necessita ainda da adição obrigatória de biodiesel, no teor determinado por lei. Supondo o diesel R5 com adição de 10% de Biodiesel, ter-se-á o diesel B10R5 chegando ao consumidor.
A expansão do Diesel Renovável no mundo
O diesel renovável é um dos biocombustíveis que mais cresce no mundo. Segunda a Agência Internacional de Energia, o crescimento da demanda por diesel renovável entre 2020 e 2026 deve superar os 14 bilhões de litros por ano — volume que é quase o dobro do crescimento esperado para o biodiesel no mesmo período, conforme demonstrado na figura 1.
Este crescimento decorre do fato de o Diesel Renovável trazer uma evolução necessária de qualidade para o uso automotivo, devido às tecnologias veiculares utilizadas nos veículos pesados mais modernos (Fase Proconve P8 no Brasil, por exemplo) e à evolução das restrições das emissões veiculares previstas para a próxima década no mundo.
É questão de tempo para que a produção de Diesel Renovável supere a de Biodiesel mundo afora. Isso não quer dizer que a demanda por Biodiesel não crescerá.
Existem vários usos não automotivos que constituem oportunidades de mercado para o Biodiesel.
Nos Estados Unidos, a CFAA (Clean Fuels Alliance America), associação de produtores de biocombustíveis, vem realizando testes para uso de maiores teores de Biodiesel em óleo de aquecimento e diversos produtores têm testado o uso de Biodiesel em óleo combustível marítimo, para auxiliar na descarbonização da navegação.
A Petrobras, inclusive, já está testando o uso de bunker com 10 % de Biodiesel em um navio da frota da Transpetro.
O desafio da descarbonização
Como descrito no artigo “Biodiesel e Diesel R da Petrobras são ofertas complementares de biocombustíveis”, o desafio da descarbonização dos segmentos “pesados” exigirá um grande esforço comparativo aos demais setores que trilham a transição energética, de modo que tanto o Biodiesel quanto o Diesel Renovável serão de suma importância para a redução das emissões de carbono, nas variadas aplicações do motor de ciclo diesel.
Nesta “sopa de letrinhas” e siglas, com novos produtos chegando ao mercado, vai-se construindo a transição.
Entender o significado de cada termo ou palavra nova é parte da mudança.
Vamos em frente, com biodiesel, diesel R, HVO, diesel verde, entre outros aparecerão.
“Enche o tanque com diesel verde aí, por favor”, pode ser realidade em alguns anos.
Químico industrial e especialista em petróleo e gás, é analista de Inteligência de Mercado da Petrobras.
Fonte: Agência epbr
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