Em 2022, a Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel) liberou para operação comercial 8,2 gigawatts (GW) de novas usinas, dos quais 68% foram de eólica e solar. Para 2024, dos 13,8 GW de potência esperados, 12,9 GW são de usinas eólicas e solares, perto de 93%. As fontes renováveis que mexeram com a matriz brasileiras com mais força nos últimos anos vão continuar ditando o crescimento da capacidade instalada de energia do Brasil. Ao mesmo tempo que criam novos desafios para o setor, como a questão do armazenamento.
O dado de 2022 não inclui a energia de micro e minigeração distribuída a partir de pequenos sistemas fotovoltaicos de geração própria em telhados, fachadas e pequenos terrenos, que sozinhas acrescentaram mais 7,3 GW de potência, praticamente toda composta por fonte solar.
Ter mais da metade da nova energia originada nos ventos ou no sol não é um fato inesperado. É o resultado de um processo de transformação que mudou a matriz brasileira ao longo deste século, entre crises energéticas e mudanças tecnológicas e de hábitos.
Junto com a energia hídrica, o Brasil se posiciona hoje como um dos países mais renováveis em energia do mundo, com indice acima de 80%, se considerar térmicas a biomassa. Essa é uma das vantagens competitivas apregoadas por autoridades do mercado de energia e que vários países vão precisar de muitos anos para alcançar o mesmo patamar.
A expectativa é que isso coloque o país como um dos principais atores na transição energética. O Brasil saiu, no início do século, após racionamento de energia que afetou a maior parte do território em 2001, de um modelo baseado essencialmente na fonte hidrelétrica para uma matriz diversificada com a chegada das fontes eólica e solar, ambas sustentadas por uma forte política estatal de subsídios. Também se viu a ampliação de uma base termelétrica, que inclui o gás natural e a bioeletricidade.
Hoje o Brasil é um dos líderes em geração hidráulica, tem tecnologias para produção de etanol e biodiesel, possui a sexta maior reserva de urânio do planeta, domina a técnica de enriquecimento do minério para fins pacíficos, é líder mundial em energias renováveis e pode se tornar um hub global de exportação de hidrogênio. Tudo isso, mantendo o pioneirismo na tecnologia de extração de petróleo.
Especialistas avaliam que o país está melhor posicionado em relação ao mundo. O presidente da PSR Consultoria, Luiz Augusto Barroso, diz que o Brasil ocupa uma posição na economia de carbono onde muitos países querem chegar em décadas. “O mix energético do Brasil tem uma participação de renováveis na faixa de 42%; no setor elétrico a fatia de usinas limpas é superior a 80%”, disse Barroso.
Ele acrescenta que, ao longo de 23 anos, o Brasil tornou-se resiliente aos efeitos climáticos ao diversificar a matriz, adicionando outras fontes limpas com a vantagem de serem economicamente competitivas. Isso permite ao Brasil ser uma potência na fabricação de produtos de alto valor agregado, que terão valor crescente numa economia de baixo carbono.
Na corrida para zerar as emissões, o professor do Instituto de Economia da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) e coordenador do Grupo de Estudos do Setor Elétrico (Gesel), Nivalde de Castro, entende que o Brasil tem posição favorável ao passo que mantém a tendência mundial de investimentos em eólica e solar.
“No mundo, essa energia renovável é para substituir as usinas térmicas a carvão, óleo e gás e aqui no Brasil ela não substitui, mas, sim, complementa as hidrelétricas”, afirma Castro.
O diretor-geral da Aneel, Sandoval Feitosa, lembra que em 2022 a maior parte das usinas liberadas para operação comercial foram das fontes eólica e solar, reforçando essa vocação do país das energias limpas. “O Brasil sempre foi referência em energias renováveis. Em termos de capacidade instalada, 75% de nossa matriz elétrica é formada por hidrelétricas, eólicas e solares”, disse Feitosa.
Prossegue o diretor-geral da Aneel: “Mesmo entre nossas termelétricas, 36% dizem respeito a biomassa, também renovável. Nos últimos 20 anos, vivenciamos importantes transformações. De um setor que era basicamente hidrelétrico, para um bastante diversificado”, afirma.
Pensando no futuro, Barroso e Castro acrescentam que a dinâmica da transição no Brasil e no mundo aponta para a necessidade de avançar nos estudos de armazenamento de energia. Antes, as grandes hidrelétricas se apoiavam em energia armazenada em grandes reservatórios. Por restrições ambientais, as novas usinas não têm mais a capacidade de armazenamento de antes, como Jirau, Belo Monte e Santo Antônio.
Os sistemas de baterias disponíveis serão uma tendência tecnológica cada vez mais usada, mas ainda têm capacidade de atendimento em períodos curtos e envolvem uma cadeia produtiva com alta pegada de carbono e processamento de minerais.
Enquanto sistemas de armazenamento mais robustos não estão totalmente disponíveis na prateleira de tecnologias disruptivas, as térmicas mais eficientes e que utilizem gás natural e combustíveis renováveis terão o papel determinante de resguardar o sistema elétrico em tempos de crise.
O futuro ainda aguarda a entrada de novas tecnologias, como eólicas no mar, hidrelétricas reversíveis e hidrogênio verde.
Fonte: Valor Econômico
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