Apesar dos desafios estruturais e desigualdades, a África se destaca como um celeiro promissor para o agronegócio, conta o especialista Flavio Castellari
A África, com suas vastas áreas de terras agricultáveis e recursos hídricos subutilizados, tem sido vista como um celeiro de oportunidades para o agronegócio e o setor de bioenergia ao redor do mundo. No entanto, segundo Flavio Castellari, especialista em gestão de ambientes de inovação e acesso ao mercado, o potencial econômico do continente ainda não foi plenamente visto, devido a desafios estruturais e econômicos significativos que precisam ser analisados e superados.
Na África Subsaariana, o agronegócio emprega cerca de 60% da população e contribui com aproximadamente 23% do Produto Interno Bruto (PIB). Apesar de sua relevância, a agricultura na região é marcada por desigualdades, com grandes propriedades rurais onde os trabalhadores, em muitos casos, enfrentam condições de remuneração inadequadas. Já a situação na África Austral apresenta uma dinâmica distinta. A agricultura comercial moderna na região é dominada por cerca de 40 mil fazendeiros que controlam 80% das terras cultiváveis, evidenciando profundas desigualdades na posse de terras.
Nos últimos anos, alguns países africanos até registraram avanços em sua produção agrícola. Um exemplo é Angola, que teve um crescimento de 5,6% na produção durante o ano agrícola de 2021/2022. Mas ainda assim, a insegurança alimentar persiste como uma preocupação crítica. Em 2017, estimava-se que cerca de 20% da população africana, ou aproximadamente 257 milhões de pessoas, sofria com desnutrição.
Investimento complexo
Em entrevista à Visão Agro, Castellari destacou que a composição política dos países africanos e a insegurança jurídica representam barreiras significativas para investidores estrangeiros. “Você sair do Brasil para investir na África é difícil. Temos que trabalhar para mostrar ao africano que ele tem potencial de investimento e que pode desenvolver a própria indústria, seja na produção de alimentos como soja e milho ou em áreas como biocombustível e pecuária”, explicou.
O especialista também enfatizou a importância de transferir o know-how brasileiro para o continente, possibilitando que os países locais adaptem e repliquem as tecnologias e métodos que impulsionaram o desenvolvimento do Brasil no agronegócio. Ele acredita que, apesar de alguns países possuírem áreas mais áridas, nações como Quênia, Zimbábue, Tanzânia, Nigéria e Etiópia têm climas e potenciais hídricos favoráveis que permanecem subutilizados.
Contudo, Castellari pontua que o continente enfrenta um ciclo vicioso de falta de financiamento e crédito para implementar tecnologias e modernizar a produção. “Há pessoas querendo desenvolver, mas esbarramos na questão de crédito para construir plantas industriais ou implementar indústrias tecnificadas”, disse ele, ressaltando que a intervenção de países desenvolvidos em fornecer financiamentos mais acessíveis seria uma das chaves para destravar o desenvolvimento.
Questões culturais
Além dos desafios econômicos, questões culturais também influenciam a dinâmica agrícola na África. Muitas vezes, há resistência em adotar estruturas de produção em larga escala, com preferências por pequenos agricultores em vez de propriedades de maior eficiência produtiva. “É preciso conscientizar que, em algumas culturas, fazendas maiores são mais produtivas e eficientes, enquanto os pequenos agricultores poderiam ser melhor organizados em cooperativas para trabalhar com produtos de maior valor agregado, como frutas, hortaliças e café”, argumentou.
O desenvolvimento da África, segundo especialistas, passa pela busca de parceiros locais, maior acesso ao crédito e um olhar estratégico que valorize o potencial africano. A oportunidade de transformação é enorme, mas os desafios exigem um compromisso global para liberar o verdadeiro potencial do continente.
Por: Fábio Palaveri – Visão Agro
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