A agropecuária, responsável por 27% das emissões brasileiras de gases de efeitoestufa, já deu os primeiros passos no mercado voluntário de crédito de carbono.
É verdade que ainda um tanto timidamente, registrando apenas 15 projetos de pecuária e 28 florestais. A oferta atual de crédito de carbono no mercado brasileiro é de menos de 1% do potencial anual do país, a maior parte em conservação e geração de energia a partir de resíduos, segundo recente estudo da McKinsey. As projeções, contudo, apontam para um futuro mais promissor.
O Brasil concentra 15% do potencial global de captura de carbono nas atividades relacionadas ao uso da terra e pode responder por 50% da oferta de crédito no mercado internacional até 2030, quando se projeta um mercado voluntário de US$ 50 bilhões. Em 2021, era de US$ 1 bilhão. O metano vindo da agropecuária é o segundo maior responsável pelo aquecimento global.
Outra conta simples também evidencia o potencial de mitigação de GEE e de sua conversão em créditos de carbono no setor. O Brasil tem hoje cerca de 30 milhões de hectares de pastagens degradadas, 22 milhões severamente degradadas. A conversão de toda a área para o sistema de integração lavoura pecuária (ILP), sistema de manejo com grande capacidade de sequestro de gases poluentes, removeria do solo 539 milhões de toneladas de carbono equivalente (CO2 e), gerando US$ 5,4 bilhões em 20 anos, com base no preço de US$ 10,00 a tonelada de CO2 e.
“Em 2005 tínhamos cerca de 3 milhões de hectares com o sistema ILP e hoje há 17 milhões. A tecnologia está dominada e é economicamente viável. Temos que acelerar essa curva e a valoração do carbono através dos mercados será fundamental”, diz Roberto Strumpf, diretor da Radicle Brasil e autor das projeções acima.
O país ainda não tem mercado regulado de crédito de carbono, contando apenas com projeto de lei tramitando no Congresso e decreto do governo editado este ano. Caso já houvesse lei específica, o valor da tonelada de CO2 e subiria para cerca de US$ 100. Sérgio Schuler, presidente do GTPS, Grupo de Pecuária Sustentável ressalta que a regulação aceleraria as negociações e o volume transacionado. “Empresas como as do setor de petróleo e aviação precisariam comprar crédito, já que emitem mais que neutralizam, para se manterem dentro da meta. A pecuária brasileira seria um dos grandes vencedores, porque poderiam vender créditos. É uma mina de ouro do Brasil”, diz.
Transformar a redução de emissões de gases de efeito-estufa em créditos de carbono e consequente receita para o produtor demanda, além de um mercado regulado, tecnologias de mensuração e monitoramento que assegurem confiabilidade capaz de destravar o potencial da agropecuária brasileira, segundo Guilherme Raucci, gerente de sustentabilidade digital da Syngenta, responsável pelo Reverte, programa de recuperação de áreas degradas no Cerrado. Escala e transparência também são necessários para o mercado avançar. A boa notícia é que a digitalização vem crescendo, sobretudo com o aumento das greentechs.
O potencial de geração de créditos de CO2 da agropecuária é também relevante por ser tratar do segundo maior emissor de gases de efeito-estufa (o primeiro é mudanças de uso da terra) em seus 112 milhões de hectares de pastagens e 76 milhões de hectares de lavouras. Ao incluir os 10 milhões de florestas plantadas, o setor assume a liderança no quesito emissões brasileiras de carbono. Pesquisa da Embrapa sobre sistemas pecuários no bioma Mata Atlântica concluiu que a produção de intensidade média (cabeças por hectare) tem a menor pegada de carbono e maior potencial de créditos.
Alexandre Berndt, chefe-geral da Embrapa Sudeste, que participou do levantamento, observa que a produção em pastagens degradadas resultou no pior quadro, chegando a ser necessárias 63,9 árvores para o abatimento das emissões de cada animal mantido. Já o sistema de média lotação (3,3 unidades animais por hectare, em que se recuperou a pastagem degradada) foi capaz de neutralizar emissões de GEE de bovinos e ainda gerar créditos de carbono com apenas seis árvores.
“Os grandes ambientes de sequestro de carbono são as árvores e o solo”, diz Marcelo Morandi, pesquisador sênior da Embrapa Meio Ambiente. Apesar disso, ele ressalta as dificuldades de mensuração de sequestro de carbono no solo, além de custos elevados de checagem. Segundo ele, a agricultura tem sido muito efetiva na redução da pegada de carbono. Falta ampliar a conversão dessa captura de CO2 e em créditos no mercado.
Fonte: Valor Econômico
Clique AQUI, entre no grupo de WhatsApp da Visão Agro e receba notícias em tempo real.