Atualmente, enfrentamos dois desafios cruciais que muitas vezes são vistos como antagônicos, mas que na realidade são complementares: a necessidade de combater as mudanças climáticas e o aumento da demanda por alimentos.
Nesse contexto, a inovação no agronegócio desempenha um papel fundamental na busca por soluções destes desafios, apesar de muitas vezes ser erroneamente percebida como parte do problema.
Ao contrário do que muitos pensam, o agronegócio passou por uma evolução significativa nas últimas décadas, impulsionado em grande parte pelas agtechs e foodtechs. Por meio da adoção de práticas inovadoras, seis grandes tendências estão reposicionando o setor e permitindo que ele alcance seu potencial máximo de transformação: tecnologias no campo, bioalternativas, acesso ao crédito, cadeias de suprimento mais eficientes, combate ao desperdício de alimentos e mercado de carbono.
Tecnologias no campo
Historicamente, a cadeia agroalimentar tem sido impulsionada por inovações tecnológicas que melhoraram a vida dos agricultores, aumentaram a produtividade e que elevaram a gestão a um novo patamar.
Um exemplo claro da presença da tecnologia no setor é o uso de sistemas de gestão. Através de modelos SaaS, esses sistemas estão se tornando cada vez mais relevantes e estão sendo amplamente adotados por pequenos e médios agricultores. Isso permite que eles se tornem mais eficientes, reduzam o desperdício e aumentem sua produtividade. Startups que oferecem tecnologias de gestão representam atualmente mais de 24% das agtechs no Brasil, com as maiores taxas de adoção pelos agricultores.
No entanto, o uso de modelos SaaS vai além dos sistemas de gestão. As Agtechs oferecem uma variedade de serviços e ferramentas que permitem aos produtores otimizar rotas durante a colheita, implementar a agricultura de precisão e até mesmo obter análises remotas do solo. Por meio dessas e outras novas tecnologias, é possível aumentar a produtividade sem a necessidade de expandir para novas áreas. Além disso, é possível reduzir o uso de insumos, o que resulta em uma agricultura mais sustentável e com menor emissão de gases de efeito estufa.
Bioalternativas
Junto com a redução do uso de insumos (fertilizantes, químicos) e aumento da eficiência, surgem insumos alternativos. Em uma era onde buscamos produtividade em paralelo a conservação do solo, água e biodiversidade, os insumos biológicos ganham força. De acordo com o Radar Agritech 2022, em 2021 essa categoria arrecadou US$ 2,6 bilhões, representando um aumento de mais de 30% no volume de investimentos em comparação com o ano anterior.
Os biopesticidas têm se mostrado uma solução inovadora e eficaz no combate a pragas, sendo adotados por agricultores de pequeno, médio e grande porte como uma forma de reduzir o uso de produtos químicos. Ao substituir, mesmo que parcialmente, os produtos químicos, o setor consegue reduzir significativamente seus potenciais impactos negativos, eliminando o risco de contaminação do solo e da água, além de contribuir para a resiliência climática.
Além dos biológicos que atuam como alternativas, o setor tem testemunhado o surgimento de soluções complementares, como os micróbios. A inovação nessa área pode ser fundamental para restaurar áreas degradadas, possibilitando a produção em locais antes considerados inviáveis, bem como para enfrentar as mudanças climáticas e aumentar a resiliência na produção de alimentos nas próximas décadas.
Acesso ao crédito
De nada adianta ter tecnologia e alternativas se os agricultores não têm acesso a elas. As Agfintechs têm desempenhado um papel relevante na transição do setor, colaborando com o empoderamento dos pequenos e médios agricultores. Isso não apenas promove uma maior profissionalização e governança na cadeia, mas também possibilita o tão esperado aumento da produtividade e a redução da pegada de carbono.
A desburocratização, a agilidade e a inclusão proporcionadas pelas Agfintechs têm posicionado os pequenos e médios agricultores, tão presentes na realidade brasileira, mais próximos aos grandes players do setor. O agronegócio requer capital de giro e, com a intensificação dos eventos climáticos adversos, as atividades se tornam ainda mais incertas. Portanto, o uso de tecnologias em conjunto com novos modelos de negócios é essencial para financiar uma agricultura resiliente às mudanças climáticas.
Alcançar novos patamares de eficiência e produtividade através da tecnologia, insumos alternativos e maior inteligência no campo é fundamental para atender às demandas futuras por alimentos e garantir um agronegócio mais sustentável.
Ao implementar essas melhores práticas no campo e alinhá-las aos critérios ESG, é possível obter maior transparência e rastreabilidade na cadeia, além de maior resiliência do setor. Esse novo cenário, com riscos reduzidos, possibilita o acesso a créditos mais acessíveis aos produtores, alimentando assim um ciclo de evolução responsável.
Cadeias de suprimentos mais eficientes
As inovações no campo e na vida do agricultor são acompanhadas pela evolução de toda a cadeia agroalimentar. Nos últimos anos, houve um aumento na busca por cadeias mais disruptivas e eficientes, e soluções que conectam diretamente o agricultor ao consumidor final desempenham um papel fundamental nesse processo.
A redução ou até mesmo a eliminação de intermediários possibilita uma maior rastreabilidade dos produtos, reduzindo os custos logísticos e os desperdícios ao longo de toda a cadeia. Com essa nova forma de operação, o consumidor final tem acesso a produtos de maior qualidade, com preços mais acessíveis e com uma pegada de carbono reduzida.
Além das diversas vantagens para o consumidor, a redução dos elos da cadeia também contribui para uma remuneração mais justa ao agricultor, empoderando-o ainda mais.
Combate ao desperdício de alimentos
Ao avançarmos na cadeia agroalimentar, é crucial examinarmos com mais profundidade a questão do desperdício de alimentos. De nada adianta aumentar a produção e reduzir a pegada de carbono desses alimentos se não conseguirmos garantir que eles cheguem ao seu destino.
Atualmente, estamos enfrentando uma realidade em que cerca de 30% de todos os alimentos produzidos no mundo são desperdiçados. Esse problema não apenas vai de encontro ao desafio de alimentar uma população em constante crescimento, mas também tem um impacto significativo na luta contra as mudanças climáticas, uma vez que todo esse desperdício de alimentos resulta em emissões de gases de efeito estufa nos aterros e lixões.
Em busca de soluções, as empresas de foodtech têm ganhado força, não apenas desintermediando as cadeias agroalimentares e colaborando com o aumento de eficiência, mas também contribuindo com tecnologia como uma aliada na gestão dos alimentos.
Mercados de carbono
Ao lado das iniciativas de redução de emissões, empresas e agricultores contam com um mercado em ascensão que tem ganhado cada vez mais importância: o mercado de carbono.
Os créditos de carbono, amplamente debatidos atualmente, desempenham um papel crucial na luta contra as mudanças climáticas. Através de ações como preservação e conservação de florestas, reflorestamento, captura de carbono e melhorias na eficiência dos processos, é possível reduzir as concentrações de gases de efeito estufa e contribuir para os objetivos estabelecidos no Acordo de Paris.
No entanto, é fundamental lembrar que o mercado de carbono por si só não é a solução. Para combater efetivamente as mudanças climáticas, é necessário que trabalhemos com um conjunto de medidas, incluindo a redução das emissões, a busca por processos mais eficientes e o investimento em novas formas de produção. Além disso, a adoção de melhores práticas e o foco na resiliência e adaptação às mudanças climáticas são essenciais.
Diferentes formas de contribuição na luta contra as mudanças climáticas
As tendências mencionadas acima contribuem para o combate às mudanças climáticas de três maneiras distintas: Tecnologias que possibilitam a redução de emissões, colaborando com a meta de emissão líquida zero (net zero); Tecnologias que auxiliam na adaptação e resiliência às mudanças climáticas e Tecnologias de carbono negativo, que têm a capacidade de capturar e armazenar carbono.
A SP Ventures, em seu mais recente fundo, AGVII, possui um portfólio de empresas que desempenham um papel importante na luta contra as mudanças climáticas.
AgFood Techs como protagonista
Estas são algumas das soluções de mercado que ganharam força no contexto atual e que posicionaram as AsFood Techs como protagonistas na transição para um agronegócio de baixo carbono e uma cadeia agroalimentar mais eficiente.
No entanto, os desafios do combate às mudanças climáticas e à crescente demanda por alimentos estão longe de serem resolvidos. Vemos um mercado muito fértil para o futuro, principalmente nos setores da cadeia agroalimentar, mas para garantir um impacto positivo e avançar na resolução desses desafios, é preciso evoluir na forma de identificar, mensurar e monitorar o impacto, proporcionando transparência ao mercado.
O novo relatório da S&P Global Sustainable traz dados que mostram que menos de 10% dos fundos climáticos estão alinhados com as metas globais de descarbonização, o que reforça a necessidade de metodologias consistentes, comparáveis e transparentes com o mercado:
“As empresas estão sob pressão para entender sua trajetória de aquecimento e planejar adequadamente a descarbonização. Essa mesma análise pode ser estendida para fundos de ações e mútuos, que representam trilhões de dólares em investimentos e desempenham um papel importante na transição energética da economia como um todo. Nossa análise aponta para um problema sistêmico – poucos fundos, mesmo aqueles que se descrevem usando linguagem verde ou específica para o clima, estão a caminho de cumprir a meta do Acordo de Paris. Compreender a trajetória é um passo importante para o planejamento de um futuro de baixo carbono.”
Dada a relevância das startups nessa jornada, os investidores e fundos de VC têm um papel importante não apenas em selecionar seus investimentos alinhados a esses objetivos, mas também em fazer parte dessa evolução, trabalhando com seus portfólios para desenvolver metodologias de mensuração e garantir a qualidade e veracidade dos dados. Essa parceria é essencial para o mercado e para o desenvolvimento dessas soluções e das que virão.
Ariadne Caballero é sócia da SP Ventures, uma gestora de fundos de Venture Capital early stage que investe em tecnologias da cadeia Ag&Food na América Latina. Juliana De Podestá é head de Impacto e ESG da SP Ventures.
Fonte: FirstCom Comunicação
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