Os preços elevados dos fertilizantes levaram a produtora rural Alessandra Zanotto, de Luís Eduardo Magalhães (BA), a cortar em 30% o volume de adubo que vai utilizar na safra 2022/23. “Já compramos 80% dos insumos, prevendo corte de cerca de 30%, especialmente nas áreas de soja. Em algodão, é arriscado trabalhar com redução de fertilizante pelo risco da cultura mas, em soja, vamos reduzir em virtude dos preços altos”, disse Alessandra, ao Broadcast Agro . Ela cultiva um total de cerca de 5 mil hectares com soja, algodão e milho. Segundo a produtora, o forte investimento na formação de um “banco” de fertilizantes no solo feito nas últimas duas safras, com preços mais atraentes, permite o corte atual sem grandes prejuízos à produtividade das lavouras.
Apesar dos preços elevados dos adubos, Alessandra afirma não ter observado nenhum problema na oferta dos insumos, o que era temido pelos produtores com o avanço da guerra entre Rússia e Ucrânia. “Não nos deparamos em nenhum momento com a possibilidade de não ter adubo. O que percebemos é um pedido de antecipação por parte das misturadoras para entregarem o quanto antes os pedidos”, comentou.
O caso de Alessandra não é isolado. Com o aumento expressivo do preço dos adubos, produtores baianos de grãos e algodão preveem reduzir a adubação das lavouras de 20% a 30% na safra 2022/23, que vai ser semeada a partir de outubro deste ano. Os maiores cortes devem ser feitos nas áreas de soja, já que algodão é mais sensível a mudanças de tecnologias e milho exige maior nível de adubação nitrogenada. Os produtores alegam que há “poupança” de ativos no solo após adubações expressivas nos anos anteriores, mas não descartam preocupações com a produtividade das lavouras.
O produtor Júlio Cézar Busato, sócio do Grupo Fazenda Busato, também planejou as compras de adubos em volume 20% menor do que o aplicado na safra 2021/22. Ele já finalizou a aquisição de fertilizantes para a temporada. “Pagamos caro, mas como são volumes grandes e há dependência da logística, não podíamos aguardar momento de melhora do mercado. O preço do cloreto de potássio quadruplicou e o do fósforo triplicou, o que puxou o custo de produção lá para cima. Acredito que este é o momento de gastarmos a poupança que criamos no solo ao longo do tempo com o cuidado de não perder produtividade”, afirmou. Busato relatou que o corte de 20%, em média, foi o nível possível de se reduzir, conforme recomendação de pelos agrônomos de suas propriedades. “Em algodão, não vejo espaço para redução de adubos pelas especificidades da cultura”, comentou Busato, que tem propriedades localizadas em São Desidério, Baianópolis, Bom Jesus da Lapa e Jaborandi.
Já Cícero Teixeira, produtor de soja e milho com 1,3 mil hectares de área plantada, ainda está avaliando o volume total a ser comprado de fertilizantes. Ele estima que tenha adquirido 40% do volume utilizado na safra passada, mas ainda avalia se comprará os 60% restantes na mesma medida. A decisão, segundo ele, vai ser tomada até agosto e setembro deste ano, para aplicação na lavoura em meados de novembro. “Se os preços diminuírem e os grãos subirem, talvez não diminua a adubação. Temos poupança no solo o que nos permite reduzir até 50% de fósforo sem afetar a produtividade. Já nitrogênio e potássio não possibilitam reduções expressivas”, comentou.
Os relatos coincidem com estimativas de consultorias privadas, como a StoneX, que prevê corte de 20% nos adubos utilizados pelos produtores. A Associação dos Produtores de Soja e Milho do Estado da Bahia (Aprosoja-BA) estima redução de 20% a 25% no uso de fertilizantes em lavouras de soja no Estado. Presidente da Aprosoja-BA, Leandro Köhn, ponderou que o corte é feito em lavouras com “perfil de solo”, em que foram investidos bons volumes de adubos nos últimos anos e que agora têm a chamada poupança de solo. “Haverá redução de fertilizantes, mas não de produtividade das lavouras. A poupança de solo nas áreas em que são feitas é suficiente para até dois anos, sem perda de produtividade”, explicou. Ele mesmo vai reduzir em 30% a adubação de suas lavouras, de 8,1 mil hectares de soja e milho. “Fizemos poupança na área irrigada com milho e boa adubação, para propositalmente poder reduzir na segunda safra de soja. Não conseguimos reduzir a quantidade de semente, de máquinas ou de defensivos. A única coisa que o produtor consegue reduzir é fertilizante”, explicou.
O motivo apontado por Köhn é o mesmo dos outros produtores: o aumento expressivo dos preços. “O valor que o produtor gastou na safra passada para comprar calcário, cloreto de potássio e fósforo para adubação, hoje ele não compra nem o cloreto de potássio neste ano. E a soja não acompanhou essa alta”, comentou. A Aprosoja-BA estima que cerca de 20% dos insumos foram comprados pelos produtores do oeste baiano, adquiridos especialmente em janeiro deste ano. “As compras estão atrasadas porque o produtor que migrou áreas de algodão e milho para soja ainda não decidiu o quanto vai comprar de nitrogenados”, justificou. O oeste baiano concentra a produção de grãos e algodão do Estado. A região é formada pelos municípios de Luís Eduardo Magalhães, Barreiras, São Desidério, Formosa do Rio Preto, Correntina, Santa Maria da Vitória, Cocos, Jaborandi, Baianópolis e Riachão das Neves.
Moisés Schmidt, presidente da Schmidt Agrícola, avaliou que o custo dos fertilizantes vai influenciar, inclusive, na decisão de plantio das culturas pelos produtores, que ainda podem optar por lavouras de menor exigência de fertilizantes, como soja, em vez de algodão e milho. “A disponibilidade e preço dos adubos podem influenciar em alterações na instalação da safra 2022/23, o que será um ponto sensível para definir a área de cada cultura. É mais fácil ter migração para soja, que permite redução de 50% a 60% de adubos, do que tirar fertilizante de milho e algodão. Os custos de fertilizantes não são condizentes com o plantio da próxima safra”, apontou Moisés. Ele pretende manter a área total plantada em 37 mil hectares com grãos e algodão e ainda não descarta redução de adubos, dos quais já garantiu cerca de 30%.
Schmidt ponderou, contudo, que mesmo com a poupança de adubos no solo, há risco de perda de produtividade na safra. “Há preocupação com safra menor. Nível de corte sem prejuízo à produtividade não existe. Reduzir fertilizantes por mais que você tenha fertilidade no solo, em um a dois anos você irá enxergar essa redução no solo. Se consumir o que tiver no solo, no ano seguinte terá de ser recomposto”, observou, acrescentando que a produtividade acima da média reportada na região está diretamente relacionada aos altos níveis de adubação.
Na mesma linha, Walter Horita, diretor-presidente do Grupo Horita – um dos principais produtores de algodão do Estado -, avaliou que a redução de 20% a 25% na adubação pode vir acompanhada de redução de produtividade. “Se o produtor estiver dependente de recursos de terceiros, a redução avaliada junto com o corpo técnico pode ser uma estratégia, mas tem de ser considerada risco de redução na produção. Na safra 2016/17, reduzimos em 60% por questão econômica e nossa produção veio dentro da estabilidade, mas há risco”, ponderou Horita. Ele não pretende reduzir o nível de adubação dos seus 112 mil hectares de lavouras na safra 2022/23 porque adquiriu os insumos antecipadamente até janeiro deste ano. “Pagamos pelo pacote de fertilizantes o dobro do gasto na safra 2021/22, mas ainda em preços melhores que os atuais”, destacou.
A Cooperativa dos Produtores Rurais da Bahia (Cooperfarms), que tem 100 grupos familiares cooperados, estima que os seus produtores cooperados adquiriram todo o pacote tecnológico de fertilização em meados de janeiro e fevereiro deste ano, antes da guerra no Leste Europeu. Embora os preços na época estivessem mais atrativos que os atuais, os volumes comprados foram em média 25% a 30% menores que os adquiridos na temporada anterior, projetou o diretor presidente da Cooperfarms, Marcelino Kuhnen. “O produtor está olhando o que tem no solo para fazer a redução assertiva do volume investido em fertilizantes, porque os preços dobraram e triplicaram em alguns ativos. Será um ano em que será colocado somente o necessário no solo, com necessidade de ser recomposto no próximo ano”, comentou Kuhnen.
Segundo Kuhnen, a relação de troca desfavorável foi determinante para a decisão de corte de adubo por parte dos agricultores. “A relação de troca de potássio para a soja passou de 6 sacas de soja para adubação de 1 hectare da safra 2021/22 para 11 sacas de soja para 1 hectare na temporada 2022/23”, revelou. Ele estima que para o cloreto de potássio (KCl), por exemplo, os cooperados pagaram US$ 870 por tonelada, ante o pico de US$ 1.200 por tonelada observado em maio deste ano, mas US$ 280 por tonelada pagos na safra 2021/22. A Cooperfarms calcula que praticamente todos os insumos a serem utilizados nas lavouras pelos cooperados já foram adquiridos. Parte dos insumos já foi recebida pelos produtores e a outra parte está sendo entregue.
Indústrias não veem redução – Apesar da intenção de corte declarada pelos produtores, a indústria local de fertilizantes disse não observar recuo nas compras dos produtores. Recentemente, executivos da Cibra e da Galvani, misturadoras com expressiva participação no mercado baiano, afirmaram à reportagem que o mercado apresenta de estabilidade a crescimento em relação às vendas de adubos da safra passada.
Isadora Duarte
Fonte: Broadcast Agro