O agronegócio é a base para o crescimento econômico e desenvolvimento do Brasil. A cada safra, o país tem reforçado o seu protagonismo na produção global de grãos, que aumentou em termos absolutos e relativos. Entretanto, tal competitividade é sensível à elementos que determinam a oferta e demanda tanto no mercado doméstico, quanto no contexto internacional. Destarte, este artigo descreve as características do mercado e da safra dos principais grãos produzidos no Brasil, bem como as projeções de preços e expectativas futuras.
Soja
Desde a década de 2000, a China vem se despontando como principal importador de soja, passando a ser vista como um importante mercado e um forte direcionador das condições de demanda. Da safra de 2022, este país foi responsável pelo consumo de mais de 115 milhões de toneladas da oleaginosa. Embora seja o maior consumo mundial, esse valor foi aquém das expectativas, ao passo que o mercado chinês se encontra em fase de desaceleração econômica frente aos efeitos das restrições relacionadas ao Covid. Ademais, o pico dos preços da soja na primeira metade de 2022 (ver Figura 1) enfraqueceu a demanda pelo processamento da soja no país.
Figura 1. Preço internacional da soja
Quanto às exportações, o Brasil continua na liderança cuja quantidade em 2022[1] foi de 88,5 milhões de toneladas. Tal resultado foi estimulado pela taxa de câmbio favorável – que atingiu valores superiores a R$/US$ 5,50 no início do primeiro semestre. A expectativa é que a taxa de câmbio se mantenha relativamente estável até o próximo ano, oscilando em níveis entre R$/US$ 5,10 e 5,20 (ver figura 2).
Figura 2. Histórico e projeção da taxa de câmbio – (R$/US$)
Em contrapartida, os Estados Unidos – cuja quantidade exportada em 2022 foi de 59,8 milhões de toneladas – também enfrentam desafios relacionados a um dólar relativamente forte, que tende a manter os preços de suas commodities para exportação relativamente alto para os compradores no restante do mundo. Como resultado, no contexto internacional, o preço da soja brasileira para exportação (US$ 483,00/tonelada em junho de 2022) esteve abaixo da estadunidense (US$ 527,00 tonelada no mesmo período), favorecendo mais uma vez a comercialização da oleaginosa na perspectiva da primeira. Ademais, o aumento da demanda interna do óleo de soja nos Estados Unidos frente a rápida expansão da produção de biodiesel, gerou-se um alto prêmio por essa oleaginosa.
No caso argentino, com a finalidade de combater a inflação doméstica, maiores impostos sob produtos exportados foram aplicados em suas comodities, as retenciones, o que acabou influenciando na redução da competitividade da soja no contexto internacional. A expectativa é que o governo argentino continue aplicando tais medidas que refletirão em ofertas de exportação mais apertadas. Isso permitiu que o Brasil absorvesse a maior parte da demanda global e compensasse as menores exportações da Argentina.
Apesar dos altos preços dos fertilizantes, mas estimulada pela taxa de câmbio que aumentou o retorno do produtor, a área colhida de soja na safra de 2022 foi de 42 milhões de hectares, valor este que representa o décimo sexto crescimento consecutivo. Diante da crescente produção de soja, projeta-se que os estoques globais aumentem, bem como os estoques na América do Sul e nos Estados Unidos.
Logo, conforme apresentado na Figura 3, o preço nominal da soja deve diminuir em relação ao seu pico recente verificado em 2021/22 e estabilizar em níveis mais baixos na safra de 2022/23. Esse comportamento é resultado da expectativa de crescimento da produção mundial frente às condições climáticas favoráveis, maiores formações de estoques e o consequente aumento da oferta da oleaginosa no mercado, o que atrai os preços para baixo.
Figura 3. Preço realizado e projetado da soja (média do Brasil)
Milho
A utilização de milho para a produção de etanol é uma prática bastante utilizada nos Estados Unidos. Esse é um dos motivos que colocam o país no primeiro lugar em termos de consumo doméstico com mais de 300 milhões de toneladas em 2022. Entretanto, diante dos altos custos de insumos para a produção deste grão, os produtores dos Estados Unidos tendem a migrar para outras culturas, tal como a soja, na próxima safra. Ao mesmo tempo, dado o cenário econômico estadunidense, existe uma expectativa de queda de consumo para o próximo ano. O efeito desse contexto é uma situação de dois gumes, refletidos tanto na oferta quanto na demanda.
No outro lado do globo, existe o caso do conflito entre a Rússia e a Ucrânia. Há uma expectativa da realização de um acordo entre os dois países para a liberação das exportações de grãos, tal como o milho, pelos portos da Ucrânia. O resultado disso é a maior oferta desse grão no mercado global, que tende a impulsionar os preços internacionais para baixo.
Para a próxima safra, são esperados menores níveis de produção de milho para diversos países, como Rússia e União Europeia, e consequentemente, a oferta global. Em contrapartida, um movimento contrário no âmbito de produção desse grão é esperado para o Brasil e Paraguai, cuja expectativa de crescimento é justificada pelo acréscimo de área produtiva.
Os movimentos na área cultivada somam-se ao fato de, tradicionalmente, milho e soja apresentarem certo grau de substituição, o que correlaciona seus preços. Assim, da mesma forma que a soja, o preço do milho deve diminuir em relação aos seus picos recentes verificados em 2021/22 e estabilizar em níveis levemente mais baixos na safra de 2022/23. Entretanto, as diferentes pressões internacionais, tanto do lado da oferta quanto do lado da demanda, contribuíram para uma tendência de preço relativamente estável na próxima safra, como mostrado na figura 4.
Figura 4. Preço realizado e projetado da soja (média do Brasil)
Em suma, a crescente demanda global por dietas diversificadas e proteínas continuará a estimular a demanda de importação para grãos de ração, como milho e soja, ainda que meio a riscos de diversas naturezas, tal qual surtos de Covid e o andamento do conflito no Leste Europeu. O aumento da demanda por essas culturas é acompanhado por uma crescente competição por participação de mercado de países como Brasil, Estados Unidos e Argentina.
Haroldo Torres – gestor de projetos do Programa de Educação Continuada em Economia e Gestão de Empresas – PECEGE.