Após uma semana de negociações, o IPCC, Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas da ONU, divulgou nesta segunda-feira (20) o relatório síntese do seu atual ciclo de avaliações sobre o aquecimento global provocado pelo homem – o próximo só deve ser publicado no final desta década.
O documento não traz novos estudos, mas sim um resumo final do conteúdo dos seis últimos relatórios elaborados pelo painel, reconhecido mundialmente como a fonte mais confiável de informações sobre as mudanças do clima.
Nele, os cientistas alertam que ainda há esperança para a ação global frente à estabilização da emissão de gases de efeito estufa na atmosfera, embora muito ainda precise ser feito para evitar o colapso climático do nosso planeta.
“Este Relatório Síntese ressalta a urgência de tomar medidas mais ambiciosas e mostra que, se agirmos agora, ainda podemos garantir um futuro sustentável habitável para todos”, disse o presidente do IPCC, Hoesung Lee.
“A integração de ações climáticas efetivas e equitativas não apenas reduzirá perdas e danos à natureza e às pessoas, mas também proporcionará benefícios mais amplos”.
Entre suas principais conclusões, o relatório, que tem 93 autores, também pontua que existem várias opções viáveis e eficazes para nos adaptarmos às mudanças climáticas e reduzirmos globalmente as emissões de poluentes.
Apesar disso, o IPCC também relembra que esse desafio continua cada vez maior, já que as demandas vistas como fundamentais para que o aquecimento do planeta não ultrapasse o limite de 1,5°C até o fim do século vêm sendo implementadas num ritmo considerado “insuficiente” pelos membros do painel.
Para chegar lá, segundo os atuais cálculos do IPCC, precisamos reduzir as emissões globais pela metade até 2030 [48%] e até 99% até 2050.
“A humanidade está num gelo fino — e esse gelo está derretendo rapidamente”, disse o secretário-geral das Nações Unidas, Antonio Guterres.
“Nosso mundo precisa de ação climática em todas as frentes — tudo, em todos os lugares, ao mesmo tempo”, acrescentou.
Principais conclusões do relatório síntese
* O uso de combustíveis fósseis está impulsionando de forma esmagadora o aquecimento global;
* A temperatura global da superfície aumentou mais rapidamente desde 1970 do que em qualquer outro período de 50 anos durante os últimos 2000 anos;
* Para manter o aquecimento em 1,5°C em relação aos níveis pré-industriais, as emissões de gases de efeito estufa devem ser reduzidas de forma profunda, rápida e sustentável em todos os setores;
* Para chegar lá, segundo os atuais cálculos do IPCC, precisamos reduzir as emissões globais pela metade até 2030 [48%] e até 99% até 2050;
* Os atuais níveis de financiamento para o clima são altamente inadequados, e ainda pesadamente ofuscados pelos fluxos financeiros para as energias fósseis;
* A mudança climática reduziu a segurança alimentar e afetou a segurança da água, e os eventos de calor extremo estão aumentando as taxas de mortalidade e doenças;
* Apesar da crescente conscientização e criação de políticas, o planejamento e a implementação da adaptação estão ficando aquém do necessário;
* Para que o nosso mundo seja sustentável e igualitário, precisamos tomar as medidas certas agora;
* Um futuro resiliente e habitável ainda está disponível para nós, mas as ações tomadas nesta década para produzir cortes de emissões profundos, rápidos e sustentados representam uma janela rapidamente estreita para a humanidade limitar o aquecimento a 1,5°C com mínimo ou nenhum excesso.
Correndo contra o tempo
Na última conferência do clima da ONU, a COP27, o documento final assinado pelos mais de 200 países-membros contemplou pela primeira vez na história uma resolução sobre um tipo de financiamento climático a países vulneráveis à crise do clima.
Chamado de perdas e danos, esse fundo era uma das questões-chave da cúpula do ano passado e uma demanda antiga de países em desenvolvimento.
Apesar de essa ser uma grande conquista apontada por especialistas, a COP 27 de Sharm El-Sheikh também foi tida como muito insuficiente em outros aspectos.
O texto final da Conferência das Partes da ONU, por exemplo, não trouxe avanços sobre o uso dos poluentes combustíveis fósseis nem colocou um limiar no pico de emissões globais de gases de efeito estufa até 2025, duas demandas vistas como fundamentais para que o aquecimento do planeta não ultrapasse o limite de 1,5°C.
Esse é o limiar de aumento da taxa média de temperatura global que temos que atingir até o final do século para evitar as consequências da crise climática. A taxa é medida em referência aos níveis pré-industriais, a partir de quando as emissões de poluentes passar a afetar significativamente o clima global.
Para chegar lá, segundo os atuais cálculos do IPCC, precisamos reduzir as emissões globais pela metade até 2030 [48%] e até 99% até 2050, algo que somente é possível se atingirmos um pico antes de 2025.
Por isso, diversas reivindicações permanecem em aberto e devem ser discutidas até a próxima cúpula da ONU este ano, em Dubai, nos Emirados Árabes Unidos.
E o relatório síntese terá um papel fundamental na cúpula, já que esta será a primeira conferência a analisar os esforços globais para reduzir as emissões desde o acordo de Paris, e incluirá petições de países mais pobres que pedem por mais ajuda.
“A constatação do relatório é de que o mundo tem muito mais investimentos indo pro problema, para financiar formas de produzir energia com combustíveis sujos do que investimentos em solucionar o problema, em mitigação e adaptação”, diz Marcio Astrini, secretário executivo do Observatório do Clima.
Alerta para o Brasil
Para o WWF Brasil, os dados do relatório são um duro recado ao governo brasileiro e às petroleiras que pretendem aumentar a exploração de combustíveis fósseis no Brasil.
A organização ressalta que no novo texto o IPCC alerta mais uma vez que as opções de mitigação estão disponíveis em todos os setores e destaca a transição energética – principalmente no caso das energias eólica e solar – como um ponto-chave para reduzir as emissões até 2030.
“O IPCC dá, novamente, um recado contundente às lideranças de todo mundo: a natureza é inegociável e a mudança precisa ser feita agora”, diz Alexandre Prado, especialista de Conservação em Mudanças Climáticas do WWF-Brasil.
Segundo a mais recente edição do “Sistema de Estimativas de Emissões de Gases de Efeito Estufa do Observatório do Clima”, o SEEG, o Brasil emitiu 2,42 bilhões de toneladas brutas de gás carbônico (CO2) equivalente, um aumento de 12,2% em relação a 2020. Isso representa a maior alta em quase duas décadas.
Segundo o relatório, a maior alta só foi verificada em 2003, ano em que o país atingiu o recorde histórico de emissões.
Fonte: g1
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