“Para sonhar um ano novo que mereça este nome, você tem de merecê-lo… . É dentro de você que o Ano Novo cochila e espera desde sempre”.
Carlos Drummond de Andrade
Muitos se referem a 2020 como o ano que não terminou. Certamente, uma alusão à gravíssima crise sanitária que assolou o planeta e que produz efeitos até hoje: ainda convivemos com o risco de novas variantes da Covid – 19 e o colapso da cadeia mundial de suprimentos continua corroendo o poder de compra da população.
De forma acertada, dedicamos o ano de 2021 à implementação do programa nacional de vacinação, que reduziu a pressão sobre o sistema de saúde e salvou de milhares de vidas. Em 2022, a tarefa foi superar um radicalismo jamais visto no País. Agora é um novo ano, é um novo governo. Devemos aproveitar o momento, arregaçar as mangas e trabalhar pela retomada do crescimento.
Na última década, o Brasil praticamente não cresceu. Entre 2019 e 2021, o Produto Interno Brasileiro (PIB) avançou 0,59% ao ano – muitos podem dizer que foi o efeito da pandemia. Entre 2015 e 2018, o crescimento médio brasileiro foi de 0,96%, enquanto a economia mundial se expandia a uma taxa de 2,96%. Nos últimos dez anos (2012-2021), a situação foi ainda pior, com o PIB crescendo apenas 0,33% ao ano, o que nos coloca como o quinto pior desempenho entre 50 maiores economias, à frente apenas de Grécia, Ucrânia, Argentina e Itália.
O problema é que os dados atuais não são nada animadores, com claros sinais de desaquecimento da economia.
Para superar essa estagnação, precisaremos de mais investimentos, elevando, por exemplo, a taxa, dos atuais 17% do PIB, para algo em torno de 22%. Mas serão fundamentais também as tão aclamadas reformas estruturantes, pois trarão equilíbrio para as contas públicas e viabilizarão um ambiente mais propício ao aumento da produção. A mais importante de todas é a que define a nova regra fiscal do País.
Ao longo dos anos, conseguimos criar um dos sistemas tributários mais complexos do mundo com diversos tributos, inúmeras legislações, alíquotas variadas, exceções e regimes especiais.
Esse emaranhado tributário tem impacto direto sobre os custos das empresas, penalizando os investimentos e trazendo insegurança jurídica. De sorte que, só em tornar o sistema mais simples já traríamos enormes benefícios para a economia brasileira. Mas se a tarefa de reformar as regras tributárias se impõe, precisamos ousar e ir além.
Estamos diante de um mundo novo, com desafios nunca enfrentados. A emergência climática exige uma nova forma de produzir, de consumir, e a transição energética se impõe como fundamental para a sobrevivência do planeta.
Defendo uma reforma tributária que estimule a migração da nossa economia para um modelo ainda mais sustentável. Temos uma das matrizes energéticas mais limpa do mundo, mas ainda há setores da economia que estão na fase inicial dessa transição. Devemos utilizar a tributação para que os preços dos bens e serviços reflitam também os seus custos ambientais. Assim estaremos induzindo uma transformação dos processos produtivos, com aumento da eficiência e do uso mais racional dos recursos naturais.
Nesse processo, o benefício não será só ambiental. As empresas podem lucrar muito com uma economia de baixo carbono. Somente na área de energia renovável, a Goldman Sachs estima que, no mundo, os investimentos seriam da ordem de US$ 16 trilhões até 2030. Se soubermos direcionar adequadamente os estímulos fiscais, poderemos acelerar ainda mais a adoção desse novo modelo.
Uma Reforma Tributária Verde pode nos ajudar ainda a superar outro grande desafio: a redução do Custo Brasil. São tantas dificuldades estruturais, burocráticas, trabalhistas e econômicas encarecendo os preços dos produtos e a logística nacional que não há como competir no comercio internacional. Mesmo internamente, existem reflexos na produção interna e na qualidade dos produtos. Esse custo, segundo os analistas, pode representar até 20% do Produto Interno Bruto – R$ 1,8 trilhão por ano.
Com tantos encargos, tornou-se uma “tarefa hercúlea” investir no Brasil, principalmente em um dos setores mais importantes para a retomada do crescimento: o de infraestrutura. Nos últimos cinco anos, os investimentos no setor tiveram uma redução de quase 50%.
Mas como ampliar os recursos em um ambiente econômico tão desafiador? Por isso, elegemos, na Câmara dos Deputados, uma pauta prioritária com potencial de destravar a economia. Em 2019, conseguimos aprovar, com parecer de minha autoria, o Projeto de Lei (PL) 7063/2017, que institui a Lei Geral das Concessões e das PPP’s – Parcerias Público Privadas. O PL é importante pois estabelece regras para os contratos que o Poder Público firma com o particular para executar obras, como rodovias e ferrovias, ou administrar serviços fundamentais para a sociedade como saneamento e aeroportos.
A proposta tem o mérito de consolidar legislações esparsas que tratam do tema em um único marco legal, reduzindo ou eliminando as interpretações distorcidas que se consolidaram ao longo do tempo. É mais segurança jurídica para os contratos públicos, fundamental para atrair mais investimentos. Aprovado na Comissão Especial, o projeto ainda aguarda aprovação no Plenário da Câmara dos Deputados. É urgente.
Outro projeto que será fundamental para recuperar a infraestrutura do País é o Projeto de Lei 2646/2020, do qual fui relator, pois cria uma nova categoria dos títulos utilizados para a captação de recursos financeiros – as debêntures de infraestrutura. São do mesmo gênero das debêntures incentivadas, mas estão direcionadas para os investidores institucionais, como os fundos de pensão e fundos de investimento, e os investidores estrangeiros.
Com a deterioração da situação fiscal do País, tem se tornado cada vez mais urgente a criação de novos mecanismos que incentivem o aumento da participação do capital privado no setor de infraestrutura – estima-se que podem ser aportados mais de R$ 1 trilhão em grandes obras. O PL está parado no Senado Federal desde o ano passado, depois que foi aprovado na Câmara dos Deputados.
Igualmente importante é a aprovação do PL 528/2021, que regula o Mercado Brasileiro de Redução de Emissões – MBRE. Em julho de 2021, a União Europeia (EU) propôs a criação da CBAM (Carbon Border Adjustment Mechanism) – um mecanismo de taxação de carbono aduaneiro para produtos exportados para o velho continente. Prevista para ser implantada a partir de 2026, a CBAM obrigará fornecedores de aço e ferro, alumínio, eletricidade, fertilizantes e cimento, cujos fornecedores a reportar o total de emissões de carbono embutidas nos produtos.
Se de um lado, esse mecanismo auxiliará o continente a alcançar a neutralidade de carbono até 2050, de outro, afetará diretamente os países exportadores, pois haverá preferência pelas mercadorias com menor pegada de carbono. Um exportador que já tenha a capacidade de monitorar as emissões de CO2 terá uma enorme vantagem competitiva. Os demais perderão mercado. A não implementação do MBRE, portanto, já tem data para produzir estragos na economia brasileira.
Reforma Tributária, Custo Brasil, Retomada do Desenvolvimento e Mercado Regulado de Carbono. É um ano novo, mas que traz desafios antigos. O que muda? Ânimo redobrado pra enfrentá-los, sempre apoiando os setores capazes de fazer a diferença em nosso País.
Essa é uma tarefa para construtores, os gladiadores ficaram no passado. Uma tarefa para os que praticam a boa política. Que tenham a reconciliação como norte e buscam, constantemente, reduzir as tensões entre as instituições. Que buscam criar um ambiente favorável ao crescimento do Brasil.
Parafraseando Drummond, se fizermos por merecer, teremos um ano maravilhoso.
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