A Raízen passará a fornecer biometano para o complexo fabril da Scania em São Bernardo do Campo (SP) a partir de 2024, em uma parceria que, de um lado, ajuda a montadora a descarbonizar suas operações ao substituir o gás natural, e de outro, impulsiona os planos da companhia de energia na oferta de soluções sustentáveis.
O acordo, com prazo inicial de cinco anos, prevê o fornecimento médio de 7,8 mil metros cúbicos de biometano por dia, volume que atende o consumo integral das fábricas da Scania, que hoje são supridas com gás natural, disseram as empresas à Reuters.
O valor do contrato não foi divulgado.
O combustível renovável, que é obtido pelo processamento do biogás e serve como substituto do gás natural, diesel e gás liquefeito de petróleo (GLP), virá das plantas da Raízen em parceria com a Geo Energética.
A Raízen já tem uma unidade operacional em Guariba (SP), onde produz principalmente biogás para geração de energia elétrica, e está construindo mais uma em Piracicaba (SP), com investimentos de R$ 300 milhões. Essa unidade, que começa a operar em 2023, será totalmente dedicada à produção de biometano.
A entrega do gás “verde” à Scania será realizada por meio da rede de distribuição de gás – neste caso, da Comgás, a quem a Raízen solicitará um estudo de viabilidade técnica e econômica.
Com a substituição do gás natural pelo biometano, a Scania superará sua meta de reduzir em 50% a emissão de gases de efeito estufa das operações industriais e comerciais até 2025, alcançando um corte de 75% no “hub” industrial paulista onde produz caminhões “de parachoque a parachoque”, afirmou o presidente e CEO da Scania Latin America, Christopher Podgorski.
O executivo destaca que o contrato assinado com a Raízen é um marco importante em um processo de transformação da estratégia da companhia que começou em 2016.
Segundo ele, como as moléculas de gás natural e biometano são equivalentes, a troca é simples e não exige grandes investimentos.
“Validamos nossos processos industriais do ponto de vista de engenharia, (fizemos) pequenas adaptações (na fábrica). São investimentos marginais, porque em última instância estamos falando da mesma substância”, explicou.
Já para a Raízen, o acordo representa mais um avanço na estratégia de ampliar seu portfólio de produtos renováveis, em meio à demanda crescente por parte de seus clientes, disse a vice-presidente de estratégia e sustentabilidade da empresa, Paula Kovarsky.
Ela lembrou que a companhia começou a explorar novas soluções renováveis com a bioeletricidade, fazendo cogeração de energia a partir dos resíduos da produção sucroalcooleira.
“Agora estamos avançando nessa jornada, estamos falando do E2G, usar o bagaço e palha (da cana) para fazer mais etanol de segunda geração, e chegando aqui no biogás, que é essencialmente pegar vinhaça e transformar em um novo produto, que é tratado para virar biometano”, disse.
Além da Scania, a Raízen já anunciou contratos de longo prazo para fornecimento de biometano à Yara Fertilizantes e à Volkswagen.
Gás para frota de pesados
A próxima fronteira que a Raízen pretende ultrapassar é a oferta de biometano para uso na frota de caminhões, mas esse plano ainda está em fase de estudos.
“Estamos fazendo testes em caminhões (movidos) 100% a gás, fizemos testes em híbridos de diesel e gás. A primeira coisa a se testar é a aplicação, a performance do caminhão, e todos os dados de eficiência”, explicou a CEO da Raízen Geo Biogas, Raphaella Gomes.
“O segundo e terceiro passos serão dados, mas é uma mudança relevante, inclusive de logística de abastecimento”, disse a executiva.
Ela lembrou ainda que a inexistência de um mercado secundário de caminhões a gás – algo importante para os negócios das transportadoras – é um dificultador para a aplicação do biometano nas frotas.
O mercado brasileiro para biogás e biometano vem crescendo nos últimos dois anos, com projetos de grandes companhias, como Raízen e Vibra. No entanto, a distribuição do combustível pelo país ainda é um entrave para os investimentos.
A própria Scania, contudo, já comercializa veículos pesados movidos a gás natural e biometano desde 2019, sendo que no Brasil já foram vendidos mais de 600 desses modelos.
Segundo dados da Associação Brasileira do Biogás (ABiogás), entre 2019 e 2021, o setor de biogás dobrou sua capacidade de produção, com a instalação de 140 novas plantas adicionando 38 megawatts (MW) na geração de energia elétrica e 120 mil metros cúbicos por dia de biometano.
Esses números, no entanto, ainda estão muito aquém do potencial do aproveitamento de resíduos da agropecuária brasileira para a produção de biometano – tanto que o segmento tem sido apelidado de “pré-sal caipira”.
A ABiogás calcula, por exemplo, que o país “desperdiça” cerca de 100 milhões de metros cúbicos de biometano por dia, volume que poderia substituir 70% do consumo nacional de diesel.
(Por Letícia Fucuchima; edição de Roberto Samora)
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