Hoje completam-se três meses desde que Caio Paes de Andrade assumiu a presidência da Petrobras. Para chegar ao principal cargo de uma das maiores empresas brasileiras, o executivo enfrentou um processo conturbado que incluiu discussões internas na petroleira sobre se ele preenchia os requisitos para a função.
A análise se prolongou por mais de um mês: Andrade foi indicado pela União, controladora da Petrobras, em 23 de maio, mas só teve o nome aprovado pelo conselho de administração da estatal em 27 de junho. Desde que assumiu como CEO, há 90 dias, a Petrobras acelerou a redução de preços dos combustíveis – uma demanda periódica do presidente Jair Bolsonaro – e fez uma mudança na diretoria da estatal.
Novas reduções de preços nos combustíveis não estão descartadas até o fim da semana, antes do 1º turno das eleições, no domingo, e há indicações que outras trocas de diretores também podem ocorrer até o fim do ano, independentemente de quem ganhar as eleições presidenciais, dizem fontes. A troca feita até agora consistiu na substituição de Juliano Dantas por Paulo Palaia na diretoria-executiva de transformação digital e inovação.
Desde o dia 19 de julho, a Petrobras fez 12 reduções em preços de combustíveis, em anúncios que têm sido praticamente semanais. A queda do petróleo no mercado internacional tem facilitado a tarefa da Petrobras de reduzir os preços, mandato que Andrade recebeu do presidente da República. Foram, ao todo, no período, quatro cortes na gasolina, que acumula queda de 19,22%, e três reduções no diesel, com redução acumulada de 12,84%. No caso do gás liquefeito de petróleo (GLP), o “gás de cozinha”, foram dois cortes, que levaram a uma retração de 10,54% nos preços. Houve também reduções nos preços de venda da gasolina e querosene de aviação (GAV e QAV) e do asfalto, produtos que sofrem reajustes mensais.
No período em que está à frente da Petrobras, Andrade quase não apareceu em eventos públicos delegando a tarefa aos diretores-executivos da empresa. Nesta segunda-feira (26), em rara aparição, o executivo enviou vídeo gravado para a abertura da Rio Oil&Gas, principal evento do setor na América Latina, que vai até quinta-feira. Na mensagem, ele disse que a companhia vai seguir priorizando a descarbonização das operações e o desenvolvimento de bioprodutos no contexto da transição para a economia de baixo carbono. “Trabalhamos sem descanso para descarbonizar em linha com o Acordo de Paris”, afirmou.
O executivo disse que não pôde participar presencialmente do evento por recomendações médicas. Este mês tornou-se público que Andrade teve detectado um carcinoma (um tipo de câncer) na cabeça e no pescoço e começou tratamento para a doença. No discurso, Andrade destacou que o foco da Petrobras é o pré-sal. “Esse é o nosso ativo de maior valor e uma das províncias petroleiras mais importantes do mundo”, disse. Ele afirmou que, ao mesmo tempo, a empresa vai desenvolver novas fronteiras de exploração, como a região da Margem Equatorial, no Norte e Nordeste do país. “Sempre atentos à responsabilidade ambiental e social”, ressaltou. E concluiu a breve mensagem: “O Brasil está na rota da melhoria do ambiente de negócios, do combate à burocracia e da ampliação da segurança jurídica, para criar as condições que precisa para crescer através do investimento privado.”
Ex-presidente do Serviço de Processamento de Dados (Serpro) do governo federal e sem experiência pregressa na indústria do petróleo, Andrade é o quarto presidente da Petrobras no governo Bolsonaro. Os três anteriores – Roberto Castello Branco, Joaquim Silva e Luna e José Mauro Coelho – foram demitidos por contrariar o presidente da República ao aumentar os preços da gasolina e do diesel. Os combustíveis se tornaram uma das principais bandeiras de Bolsonaro no projeto de reeleição. Na segunda-feira (26), em sabatina, Bolsonaro voltou a elogiar a gestão de Andrade, que é próximo do ministro da Economia, Paulo Guedes (ler mais sobre Andrade em Ata do conselho conta como foi eleição em 27 de junho).
“Andrade assumiu a presidência [da Petrobras] de maneira silenciosa, não conversou com os públicos de interesse da empresa. É um nome frágil, nomeado para atender aos interesses do governo”, critica William Nozaki, coordenador-técnico do Instituto de Estudos Estratégicos de Petróleo, Gás e Biocombustíveis (Ineep), entidade ligada aos petroleiros. Nozaki acrescenta: “A companhia passou a repassar as baixas nos preços com maior velocidade e é sintomático que isso tenha ocorrido no período eleitoral. Não se pode desconsiderar que essa gestão tem sido beneficiada pela mudança no cenário internacional, com a queda do preço do petróleo, mas a forma como os repasses vêm acontecendo sinaliza uma gestão marcada pela necessidade de atender aos interesses eleitorais do governo.”
O Valor procurou a Petrobras para ouvir Andrade, mas o executivo não respondeu diretamente. Em nota, a empresa afirmou que tem mantido a prática de preços de mercado. “Foram realizadas reduções recentes, que acompanharam a evolução dos preços de referência, sempre buscando o equilíbrio com os preços de mercado e evitando, contudo, o repasse para os preços internos da volatilidade conjuntural das cotações e da taxa de câmbio.” Fontes dizem, porém, que a Petrobras estaria operando abaixo da média móvel usada para definir as cotações, em um “piso” que facilitaria as reduções.
Na nota, a companhia destacou o pagamento de dividendos: “Em julho, foi aprovada a remuneração aos acionistas de R$ 6,73 por ação ordinária e preferencial. Da remuneração total aos acionistas, 36,6% são destinados para a União, que detém a maior parte das ações ordinárias da companhia. A maior parte da remuneração aos acionistas paga pela Petrobras retorna à União e à sociedade brasileira, incluindo os mais de 700 mil acionistas brasileiros.” De acordo com a empresa, os dividendos têm sido acompanhados pelo aumento dos investimentos de forma “responsável e compatível com a sustentabilidade financeira da companhia”.
No setor de petróleo, não há consenso sobre a gestão de Andrade. Há quem considere que a falta de experiência dele nessa indústria não tem atrapalhado a atuação como CEO: “Ele está aprendendo, assim como o Luna”, diz fonte em referência a Joaquim Luna e Silva, general da reserva que havia sido presidente de Itaipu Binacional antes de chegar à Petrobras. Mas há críticas ao que se considera uma gestão distante de funcionários e da alta administração. “A gestão dele é curiosa pois optou por ficar a maior parte do tempo em Brasília, guardando um distanciamento”, disse um executivo. Na nota, a Petrobras disse que Andrade tem trabalhado presencialmente, tanto na sede, no Rio, como no prédio da Petrobras em Brasília, e, eventualmente, em São Paulo.
Fonte: Valor Econômico
Clique AQUI, entre no grupo de WhatsApp da Visão Agro e receba notícias em tempo real.