O ano de 2022 terminou com boas notícias para o mercado de biogás no Brasil. A expectativa é que a produção tenha alcançado 2,8 bilhões de metros cúbicos, em um crescimento de 21,3% em relação a 2021 — em comparação a 2020, o aumento chega a 33%. Em 2022, pelo menos 56 plantas foram instaladas ou reformadas, somadas a 755 já existentes, segundo a CIBiogás, centro de referência em energias renováveis.
Para efeito de comparação, em 2017, o país contava com 271 plantas. Em 2021, esse número já havia chegado a 755, com oferta de 2,3 bilhões de metros cúbicos de biogás. Até 2030, devem ser ofertados 30 milhões de metros cúbicos do gás natural renovável por dia, equivalentes a 11 bilhões de metros cúbicos por ano, de acordo com estimativas da CBIogás.
O biogás, produzido a partir da decomposição de matéria orgânica, é considerado uma matriz energética limpa. Na forma de biometano (biogás com altos níveis de pureza), pode substituir o diesel e o gás natural. O gás renovável também é usado para a geração de energia elétrica. “A demanda por parte das empresas, que têm empregado o biogás em seus processos produtivos, vem crescendo em grande parte devido à necessidade de reduzir a emissão de gases do efeito estufa”, diz Tamar Roitman, gerente executiva da Associação Brasileira do BIogás (Abiogás).
Com o mercado aquecido, os investimentos seguem em alta. Nos próximos cinco anos, 40 usinas devem entrar em operação, demandando aportes da ordem de R$ 8 bilhões, segundo a Abiogás. Nos últimos anos, o mercado movimentou cerca de R$ 3 bilhões.
A representatividade do biogás na matriz energética brasileira também tem crescido. Em 2021, último ano com dados disponíveis, representou 1,4% da geração de energia no país, com uma expansão de cerca de 9,5% ao ano desde 2019, segundo a Empresa de Pesquisa Energética (EPE), vinculada ao Ministério de Minas e Energia. Atualmente, o Brasil conta com 422 plantas de geração de energia elétrica a partir do biogás. Outras cinco usinas já foram autorizadas a entrar em operação pela Associação Nacional do Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis (ANP).
Atualmente, o Brasil ocupa o nono lugar no ranking dos países que mais produzem energia através do biogás, atrás da Tailândia e França. A Alemanha figura como líder absoluta, com a geração de 7.459 MWs por ano. Caso a expansão do setor se confirme, nos próximos dez anos o país deverá galgar mais posições no ranking.
“O país possui um potencial significativo para a produção de biogás, especialmente devido à potência do agronegócio brasileiro, principal fonte de matéria-prima para essa matriz energética”, afirma Roitman. A atividade agropecuária, com destaque para a pecuária e a produção de açúcar e etanol, responde por 80% das plantas de biogás em operação no país. Em contrapartida, produz 10% do volume de biogás. O setor de saneamento, com 9% das plantas em operação, produz 74% do total ofertado. A boa notícia é que há um grande potencial de expansão na produção de biogás pelo setor sucroalcooleiro.
A capacidade de investimento das usinas já vem colocando o agronegócio na linha de frente da produção de biogás no Brasil e deve crescer ainda mais. Com isso, a expectativa é de um maior ganho de escala nos próximos anos, o que deverá gerar um fôlego novo para o mercado de biogás.
Grandes empresas do setor sucroalcooleiro vêm aumentando consideravelmente os investimentos no setor. A Raízen deve inaugurar sua segunda planta de biogás (e a primeira totalmente dedicada ao biometano) neste ano, mediante investimentos da ordem R$ 300 milhões. Localizada em Piracicaba, no interior de São Paulo, a fábrica deverá ter capacidade para produzir 26 milhões de metros cúbicos de biogás por ano. A produção será direcionada a dois grandes clientes, a Yara e a Volkswagen, que devem utilizar o gás natural renovável em seus processos produtivos.
“Acreditamos que o setor sucroalcooleiro será um importante vetor de crescimento da produção de biogás. Cada usina terá uma solução específica de acordo com sua situação industrial. Temos um plano de investimentos ambicioso a partir da inauguração da nossa primeira planta de biogás em 2023″, diz Christiano Forman, presidente da produtora independente de energia Albioma no Brasil.
O mercado está de olho também em um subproduto importante do biogás, o CO2. A demanda por gás carbônico, utilizado pela indústria de alimentos e bebidas, siderúrgica e hospitais, entre outras, segue em ascensão. A questão é que as principais fontes de CO2 são os derivados de petróleo, prejudiciais ao meio ambiente. O biogás vem surgindo como uma alternativa à obtenção de gás carbônico. O CO2 é liberado durante o processo de purificação do biogás e pode ser armazenado para comercialização.
Projetos relacionados à produção de hidrogênio verde, considerado o combustível do futuro, também começam a despontar. Rico em metano e dióxido de carbono, o biogás pode ser transformado em hidrogênio verde por meio de processos de tratamento e purificação.
Grandes grupos empresariais, como a Engie, Fortescue Future Industries (FFI), Neoenergia, AES, EDP, Eneva, Nexway e Transhydrogen, já anunciaram a intenção de investir na fabricação de hidrogênio verde no país, especialmente nos polos industriais de Camaçari, na Bahia, Pecém, no Ceará, e Suape, em Pernambuco. A produção do novo combustível deve chegar a 13 milhões de toneladas até 2040 no Brasil. Em 20 anos, esse mercado pode movimentar US$ 200 bilhões globalmente, segundo projeções da consultoria McKinsey.
Desafios
Apesar do crescimento do mercado e perspectivas positivas para os próximos anos, há desafios a serem vencidos. Um deles diz respeito ao escoamento e distribuição. “O Brasil conta com poucos gasodutos e a maioria está situada no Sudeste, o que dificulta a expansão mais acelerada do setor”, diz Roitman.
A falta de uma infraestrutura abrangente, com uma malha mais ampla de gasoduto de transporte e unidades de processamento, representa outro gargalo importante, já que dificulta o ganho de escala.
O marco regulatório do gás, aprovado em 2021, possibilitou uma abertura de mercado ao vetar que uma mesma empresa atue em todos os processos de produção e distribuição do gás natural — até então, a Petrobras controlava, majoritariamente, a importação e processamento e cerca de 80% da distribuição. Com isso, abriram-se novas expectativas para o aumento da competitividade e da chegada de novos players ao setor. Na prática, havia um monopólio da Petrobras, o que não favorecia a iniciativa privada, na visão do mercado.
A nova lei trouxe ainda o regime de autorização para a construção de gasodutos, dispensando a exigência de licitação pública. Ainda falta, no entanto, promover uma harmonização entre a legislação federal e as legislações estaduais sobre o transporte do gás. “É preciso resolver gargalos de infraestrutura e temas legais para que o setor possa conquistar saltos mais significativos de crescimento”, diz Roitman.
Fonte: Czarnikow – Czapp
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