Maior empresa brasileira, motor de investimentos no país e foco de denúncias de corrupção no passado recente, a Petrobras se mantém nos holofotes das eleições 2022. A empresa, que chegou a ter planos quinquenais de investimento de mais de US$ 200 bilhões, hoje é mais enxuta, com foco em desinvestimentos e na exploração de ativos de classe mundial, notadamente as reservas do pré-sal.
Os rumos a serem tomados pela estatal a partir de janeiro de 2023 são diversos a depender do vitorioso nas eleições de outubro. Com a reeleição do presidente Jair Bolsonaro, a tendência é de manutenção da política de desinvestimentos, inclusive das refinarias. Colocaria ainda sobre a mesa uma possibilidade por muito tempo considerada tabu: a privatização da empresa, defendida pelos ministros de Minas e Energia, Adolfo Sachsida, e da Economia, Paulo Guedes, e citada com certa recorrência pelo próprio Bolsonaro.
Uma vitória do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva enterraria de vez o debate sobre a privatização da estatal, na visão de especialistas do setor. Lula já disse, inclusive, que pretende reforçar a Petrobras, que, nas palavras dele, não será apenas uma empresa de petróleo, mas uma companhia de energia.
Um novo governo do PT também deve trazer de volta, em algum nível, a política de conteúdo local nas compras da estatal. As vendas das refinarias, na visão de fontes de mercado, deverão ser suspensas, mas a visão não é tão clara com relação a outros desinvestimentos, como campos maduros.
Em relação à principal questão envolvendo a estatal nos últimos anos, a política de paridade de preços dos combustíveis ao mercado externo, as visões de Bolsonaro e Lula se aproximam, embora os discursos tenham abordagens diferentes. O atual presidente da República foi crítico das altas de preços dos derivados praticadas até meados deste ano e tem reverberado, como bandeira pela reeleição, as recentes reduções de preços decorrentes da queda das cotações do petróleo.
Embora afirme que não vai interferir nos preços com uma canetada, Bolsonaro já teve, durante seu governo, quatro presidentes da Petrobras e as trocas sempre aconteceram após momentos de alta dos preços nas refinarias.
Lula é mais direto quanto ao assunto preço e já afirmou que a paridade internacional não pode ser o parâmetro de definição dos preços dos combustíveis, que na visão dele devem estar ligados aos custos nacionais que incidem sobre a estatal.
A expectativa de agentes do setor é que a intervenção política na Petrobras, que tem sido uma realidade no governo Bolsonaro, se mantenha a partir de 2023, seja o novo presidente o próprio Bolsonaro ou Lula. A seguir, o Valor apresenta os principais pontos da agenda da Petrobras a partir de 2023:
Preço dos combustíveis
A expectativa para um eventual governo Lula é de que a Petrobras abandone a atual política de preços atrelada ao preço internacional do petróleo e dos derivados. O candidato já se manifestou diversas vezes que pretende mudar a forma como a estatal calcula os valores de venda de derivados nas refinarias.
“A PPI [Política de Paridade Internacional] é para agradar os acionistas em detrimento de 215 milhões de brasileiros”, afirmou Lula recentemente.
Essa política de paridade internacional determina que a companhia mantenha os seus preços de venda o mais próximo possível dos praticados no mercado internacional, considerando não apenas as cotações externas, mas também a variação cambial. Lula ressaltou também que a precificação de derivados como a gasolina e o diesel tem que ser baseada “em função dos custos nacionais” que incidem sobre a estatal.
A visão é criticada por especialistas uma vez que o petróleo é uma commodity cujo preço é formado no mercado internacional e porque a política dos governos do PT, de represar aumentos nos combustíveis, contribuiu para as perdas financeiras bilionárias na empresa.
Caso Bolsonaro saia vitorioso das urnas, é possível que a Petrobras siga com uma atuação para amortecer a volatilidade internacional sobre os preços dos derivados. Ao longo de quase quatro anos, o governo Bolsonaro teve quatro presidentes diferentes na estatal. As substituições aconteceram sempre depois de desgastes com o presidente devido a elevações dos derivados.
Essa semana, Bolsonaro elogiou o atual presidente da companhia, Caio Mário Paes de Andrade, cuja gestão tem sido beneficiada pela queda das cotações internacionais, que levaram a uma redução expressiva nos últimos meses nos preços dos combustíveis nas refinarias. Mesmo assim, o presidente da República afirmou que vê espaço para mais cortes nos valores de venda dos derivados produzidos pela estatal.
Ao longo de seu governo, Bolsonaro afirmou diversas vezes que não poderia reduzir os preços com uma “canetada”, mas a velocidade dos cortes recentes foi muito maior que o ritmo de aumentos quando as cotações internacionais estavam elevadas. A queda acumulada na gasolina, entre 20 de julho e 2 de setembro, foi de 19,22%, em quatro rodadas de reduções de preços. Já o diesel caiu 12,84% desde 4 de agosto.
Refinarias
Caso o presidente Jair Bolsonaro seja reeleito, a expectativa é que o processo de venda das refinarias da Petrobras prossiga. Acordo fechado entre a estatal e o Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade) em 2019 prevê a venda de oito unidades de refino da companhia. Desde então, foram vendidas a Refinaria Landulpho Alves, na Bahia; a Reman, em Manaus; a SIX, no Paraná; e a Lubnor3, no Ceará. Pelo acordo, anda deveriam ser negociadas a Gabriel Passos (MG), a Abreu e Lima (PE), a Getúlio Vargas (PR) e a Alberto Pasqualini (RS).
Em junho, a Petrobras informou que vai reiniciar os processos de venda de Abreu e Lima, Getúlio Vargas e Alberto Pasqualini. A venda dos ativos é parte da estratégia do governo, via Ministério da Economia, de aumentar a concorrência no setor de produção de derivados, o que, na visão do ministro Paulo Guedes, deve contribuir para preços menores dos combustíveis a longo prazo.
Em um eventual governo Lula, a expectativa do mercado é de que as vendas das refinarias sejam suspensas. Fontes consideram inclusive a possibilidade de que se volte a cogitar a construção de novas unidades de refino, de forma a evitar a dependência de importações de derivados. Ter refinarias nas mãos da Petrobras também garantiria um maior controle sobre os preços dos combustíveis, tema caro ao PT.
O problema é que a indústria de refino tem se mostrado, historicamente, como um negócio de menor margem de retorno. Investir, eventualmente, em novas refinarias pode representar um risco considerando todo o histórico de projetos inacabados e superfaturados que o PT enfrentou em suas administrações.
Privatização
O primeiro ato do ministro de Minas e Energia, Adolfo Sachsida, ao tomar posse este ano foi indicar a intenção de privatizar a Petrobras. Em agosto, o ministro afirmou que a privatização da estatal demoraria em torno de três anos. Essa semana, o presidente da República, Jair Bolsonaro, afirmou que seu governo tem vontade de vender a companhia, mas admitiu que o tema tem que passar por diversos trâmites no Congresso.
Uma fonte próxima à estatal afirmou que, em caso de vitória de Lula, o debate sobre a privatização da empresa estaria “enterrado”. A expectativa é, inclusive, que a empresa seja fortalecida como estatal, uma vez que o ex-presidente já afirmou em entrevistas que a companhia será não apenas uma empresa de petróleo, mas uma “empresa de energia”. O próprio Lula disse no fim de semana que, caso eleito, vai “acabar com esta estupidez de querer privatizar a Petrobras”.
No mercado, se cogita que a estatal possa, em caso de novo governo do PT, fazer uma oferta pela Vibra, antiga BR Distribuidora. Lula já disse que a BR foi vendida por preço irrisório. Outra possibilidade ventilada é uma fusão entre Petrobras e a recém privatizada Eletrobras, na qual o governo ainda tem participação relevante.
Conteúdo local
Nos dois governos de Lula, o incentivo às compras de equipamentos nacionais foi a tônica que norteou a reconstrução da indústria naval brasileira. O crescimento dos investimentos da Petrobras levou à formação de grandes estaleiros, que se beneficiavam do compromisso da estatal de realizar a maior parte de suas encomendas no país. A estratégia naufragou economicamente por ser baseada em apenas um comprador, uma vez que nunca houve a esperada diversificação de empresas compradoras nem escala nas encomendas. Quando a Petrobras sofreu com o esfriamento do mercado de petróleo e com os efeitos das investigações da Lava-Jato, os grandes estaleiros nacionais quebraram.
Mesmo assim, em caso de vitória de Lula espera-se algum nível de retomada das compras nacionais. De fato, um novo governo do PT encontraria uma estatal “menor”, com investimentos mais “modestos” se comparados aos recursos dispendidos até a metade da década passada.
Caso Bolsonaro saia vitorioso das urnas, a expectativa é de continuidade da atual política, sem ênfase em grandes projetos baseados em conteúdo local.
Este ano, por exemplo, a cingapuriana Keppel Shipyard venceu, com proposta de US$ 2,9 bilhões, licitação para construir as plataformas P-80 e P-82, que serão utilizadas no campo de Búzios, no pré-sal. Essas plataformas são construídas fora do Brasil.
Desinvestimentos
Uma vitória de Bolsonaro manteria o viés de venda de ativos menos relevantes no portfólio da Petrobras. Desde o governo Michel Temer, a estatal segue um plano de desinvestimentos que inclui não apenas as refinarias, mas operações como campos maduros onshore e offshore.
Uma vitória de Lula traria algum nível de incerteza para a continuidade desse processo. Ainda não está claro se a decisão seria no sentido de parar a política de desinvestimentos. Poderia, eventualmente, se fazer uma seleção de ativos a serem vendidos, política que poderia englobar campos de petróleo menos rentáveis. Um executivo de petroleira ouvido pelo Valor afirmou, com a condição de anonimato, que os contatos feitos com interlocutores ligados a Lula é de que nada mudaria. “A mensagem que nós recebemos da esquerda é que a reciclagem de portfólio da Petrobras vai continuar”, disse.
O fato é que os governos do PT se mostraram avessos, em administrações anteriores, à venda de ativos ou privatizações.
Fonte: Valor Econômico e extraído via newsletter da SCA
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