Por: Alex Ramos, Presidente da Visão Agro
O setor sucroenergético brasileiro está enfrentando um dos maiores desafios das últimas décadas: os incêndios em larga escala. Em agosto deste ano, presenciamos a devastação de vastas áreas de canaviais, resultando em perdas profundas tanto para a produção quanto para a reputação do setor. De acordo com a Organização de Associações de Produtores de Cana do Brasil (Orplana), mais de 200 mil hectares de cana-de-açúcar foram destruídos pelo fogo, causando um prejuízo estimado em R$ 1,5 bilhão. Essa tragédia representa um golpe significativo para um setor que é um dos pilares da matriz energética limpa do país.
Os incêndios se concentraram principalmente em quatro estados: São Paulo, Goiás, Mato Grosso do Sul e Minas Gerais, com São Paulo sendo o mais atingido. No dia 23 de agosto, o fogo devastou cerca de 350 mil hectares em apenas 24 horas, um número alarmante que evidencia a gravidade da situação. As perdas para os produtores são expressivas, não apenas em termos de produção imediata, mas também devido ao alto custo de replantio, que gira em torno de R$ 13 mil por hectare.
Particularmente preocupantes são as áreas de rebrota, onde a cana já havia sido cortada e estava em processo de crescimento para nova colheita. Nesses casos, estima-se que a perda de produtividade possa chegar a 40%, o que compromete não só o rendimento atual dos produtores, mas também a sustentabilidade de suas operações no médio prazo. Além disso, a capacidade do setor de atender à crescente demanda por açúcar e bioenergia pode ser colocada em risco, caso esses eventos climáticos extremos continuem a ocorrer com frequência.
Combate à desinformação
É imperativo abordar a questão da desinformação em torno das queimadas. O setor sucroenergético passou por uma transformação radical nos últimos anos, evoluindo de uma indústria focada na produção de açúcar e álcool para um setor bioenergético que utiliza a biomassa da cana para gerar energia elétrica limpa. No entanto, ainda persiste uma visão ultrapassada que associa o setor à prática da queima de canaviais, o que não reflete a realidade atual.
Precisamos deixar claro que os incêndios recentes não foram causados pelos produtores e que a prática da queima controlada já não faz parte das técnicas agrícolas modernas. O fogo, longe de ser uma vantagem, resulta em enormes prejuízos econômicos, ambientais e para a saúde pública. A imagem dos canaviais em chamas não é apenas enganosa, mas também obscurece os esforços contínuos que o setor tem feito para se adaptar às novas exigências ambientais e climáticas.
Há muito tempo, o setor deixou de utilizar a queima controlada como método de colheita. A cana-de-açúcar é hoje uma fonte valiosa de energia limpa, sendo sua palha utilizada para a produção de eletricidade em caldeiras. Não faz sentido desperdiçar essa matéria-prima queimando-a, já que ela pode ser convertida em energia renovável. O argumento de que os produtores se beneficiam das queimadas é não só equivocado, mas também prejudicial à imagem de um setor que tem investido fortemente em tecnologias sustentáveis.
Ainda que as condições climáticas extremas tenham desempenhado um papel central na propagação dos incêndios, é importante destacar que muitos dos focos são resultado de fatores estruturais e conjunturais, como a falta de fiscalização eficiente e de políticas públicas adequadas. O fenômeno do “Triplo 30”, que combina umidade abaixo de 30%, ventos acima de 30 km/h e temperaturas superiores a 30°C, criou um ambiente favorável para a intensificação dos incêndios. Em agosto, enfrentamos temperaturas superiores a 35°C, ventos de 70 km/h e uma umidade relativa do ar inferior a 15%, o que acelerou a propagação do fogo em diversas regiões.
Diante desse cenário, torna-se urgente a necessidade de uma infraestrutura mais robusta para combater incêndios de grande proporção. A carência de aeronaves especializadas para o combate ao fogo no estado de São Paulo foi uma das falhas mais evidentes durante os recentes eventos. Além disso, é fundamental que haja uma colaboração mais estreita entre o governo, o setor privado e a sociedade civil para desenvolver estratégias preventivas e de resposta rápida a esses incêndios.
Prevenção é a solução
Não podemos focar apenas no combate ao fogo; a prevenção precisa ser uma prioridade. A Canaoeste, em parceria com a GMG Ambiental, tem desenvolvido um trabalho essencial de monitoramento e detecção de incêndios por meio da plataforma Orion, que utiliza imagens de satélite para identificar focos em questão de minutos. Embora esse avanço tecnológico seja crucial para minimizar os danos, ele não é suficiente. Precisamos de uma política pública integrada que envolva todos os atores da cadeia produtiva e do poder público na prevenção dos incêndios.
É igualmente importante que o governo intensifique sua atuação na criação de políticas públicas que auxiliem os produtores a enfrentar os desafios impostos pelas mudanças climáticas. O setor sucroenergético, além de ser vital para a economia do Brasil, desempenha um papel estratégico na transição energética global. Não podemos permitir que eventos como esses incêndios comprometam o futuro de um setor que está na vanguarda da produção de energia limpa e renovável.
Estamos, sem dúvida, atravessando um momento crítico. No entanto, acredito firmemente que, com a união e cooperação de todos os envolvidos – produtores, governos e sociedade – o setor sucroenergético se reerguerá. Mais do que nunca, é necessário um compromisso com a verdade e com a disseminação de informações corretas. Não se trata apenas de recuperar as áreas afetadas pelos incêndios, mas de assegurar o futuro de um setor que é fundamental não apenas para o Brasil, mas para o mundo, na luta por um futuro mais sustentável e limpo.
O que está em jogo é o futuro de uma cadeia produtiva que gera empregos, inovação e sustentabilidade. Enfrentaremos juntos essa crise, aprendendo com os desafios e nos preparando para um futuro em que a prevenção e a adaptação climática serão pilares fundamentais da nossa resiliência.
Por: Alex Ramos – Presidente da Visão Agro
Com quase cinco décadas de experiência em comunicação, Alex Ramos atuou como radialista por 22 anos, apresentador de TV por 10 e jornalista por 13 anos, desempenhando o papel de colunista empresarial e editor. Formado em jornalismo e pesquisa pela FGV, também possui certificação da FGV-AGRO como jornalista especializado no setor agroindustrial, além de ser bacharel em teologia pela Unifil – Centro Universitário Filadélfia. Fundador da Visão Agro, Alex Ramos foi editor-chefe da Revista Visão da Agroindústria e do Portal Visão Agro e atualmente preside a empresa.
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