Nas contas do governo, medida deve evitar a importação de 2 bilhões de litros de diesel e evitar gastos de R$ 7,2 bilhões
Começou a vigorar nesta sexta-feira (1/3) a nova mistura de biodiesel no diesel derivado de petróleo. A proporção passa de 12% para 14%, conforme resolução do Conselho Nacional de Política Energética (CNPE). A decisão antecipou o calendário de adoção do biocombustível na matriz de transportes do Brasil.
Pelo cronograma, em 2024 a proporção passaria para 13%, com aumento de um ponto percentual a cada ano seguinte, conforme o mandato atual previsto em lei, de 15%. O diesel com 14% de biodiesel (B14) atende a uma demanda da cadeia produtiva dos biocombustíveis e de suas matérias-primas, como a soja.
O biodiesel é visto como uma solução imediata para a descarbonização do ciclo diesel. Caminhões, ônibus, alguns utilitários, como caminhonetes, além de máquinas agrícolas, estão aptos a receber o combustível com a mistura.
Nas contas do setor, o B14 demandará uma produção de 8,9 bilhões de litros do biocombustível neste ano. No ano passado, foram 7,3 bilhões. E, para 2025, quando a proporção deve passar a 15%, a projeção é de 10,1 bilhões de litros.
Nos cálculos do Ministério de Minas e Energia, o B14 evitará a importação de 2 bilhões de litros de óleo diesel, evitando gastos de R$ 7,2 bilhões com o diesel fóssil. A previsão do governo também é de reduzir a capacidade ociosa do parque industrial do biocombustível.
“O Brasil já possui capacidade instalada para atender a mistura de 20%”, avalia Daniel Amaral, diretor de economia e assuntos regulatórios da Associação Brasileira das Indústrias de Óleos Vegetais (Abiove), que representa a indústria de soja.
Levantamento da Abiove em conjunto com a Associação dos Produtores de Biocombustíveis do Brasil (Aprobio), a União Brasileira do Biodiesel e Bioquerosene (Ubrabio) e a Frente Parlamentar Mista do Biodiesel do Congresso Nacional (FPBio) aponta que, para atender à demanda de 20% de mistura, o chamado B20, seriam necessários 13,2 bilhões de litros. A capacidade instalada atual nas indústrias já é maior, de 14,7 bilhões, segundo a Aprobio.
Fornecedora da principal matéria-prima para a produção do biodiesel no Brasil, a cadeia produtiva da soja deve sentir o maior impacto da nova mistura sobre o seu quadro de oferta e demanda. Ainda mais em uma safra como a de 2023/24, em que problemas climáticos vêm causando perdas de produtividade em diversas regiões do país.
Em 2023, o óleo de soja respondeu por 69% da fabricação do biocombustível no país. Gorduras animais, em expansão, já respondem por outros 10%. E vem aumentando também a utilização do óleo culinário reciclado para produzir biodiesel.
A indústria de soja reduziu sua estimativa para a safra brasileira do grão 2023/24, com a colheita em andamento no país. Mas manteve a expectativa de demanda para esmagamento. Com a queda de safra, parte da oleaginosa que seria exportada tende a migrar para o mercado interno.
A Abiove projeta uma produção de 153,8 milhões de toneladas, número ainda superior aos do governo brasileiro e de outras instituições do setor privado, que apontam para uma colheita inferior a 150 milhões. A indústria de soja prevê processar de 54,5 milhões de toneladas do grão. E como a safra deve ser menor que a de 2022/23, a Associação diminuiu sua estimativa de exportação do grão, para 97,8 milhões de toneladas.
A produção total de óleo de soja deve ser de 11 milhões de toneladas, segundo a Abiove. Desse total, 5,8 milhões devem ter como destino as usinas de biodiesel para atender à demanda para o B14. Em 2022, foram 4,1 milhões; em 2023, 4,8 milhões; e, para 2025, levando-se em conta a chegada do B15, a demanda deve ser de 7,1 milhões de toneladas.
O processamento da soja resulta em 80% de farelo – insumo de ração para cadeias produtivas como aves e suínos – e 20% em óleo. Produzir mais óleo implica em mais produção de farelo, “ao provocar o aumento da oferta de farelo no mercado brasileiro, a produção de biodiesel gera efeitos deflacionários”, avalia Julio Cesar Minelli, Diretor Superintendente da Associação dos Produtores de Biocombustíveis do Brasil (Aprobio).
O diretor da Aprobio cita um trabalho publicado no final de 2022 pelo Grupo Técnico da Agricultura, Pecuária e Abastecimento do governo de transição, segundo o qual o aumento da mistura obrigatória de 10% para 15%, com consequente aumento da oferta de farelo para a indústria de rações, reduz os custos para as cadeias de carnes, ovos e lácteos gerando um efeito deflacionário de 0,25%. “No computo final, o biodiesel reduziria em 0,23% os preços do combustível aos consumidores”, conta.
A mistura de biodiesel ao diesel se tornou obrigatória em 2008. De acordo com o cronograma oficial do Conselho Nacional de Política Energética (CNPE), vinculado ao Ministério de Minas e Energia (MME), o atual mandato limita a proporção em até 15%. No entanto, já se discute a mudança na legislação, que permitiria chegar a 20% até 2030 e a 25% a partir de 2031.
A regra está prevista no Projeto de Lei Combustível do Futuro, em tramitação no Congresso Nacional. O deputado Arnaldo Jardim (Cidadania-SP) apresentou o relatório na segunda-feira (26/2).
Atualmente, há 60 usinas distribuídas em 14 Estados brasileiros. Destas, dez estão em processo de expansão e oito em construção. Com as expansões, a capacidade chegaria a 16,25 bilhões de litros, volume que seria capaz de atender à mistura de um quarto de biodiesel no diesel fóssil, como prevê a proposta do novo mandato.
Enquanto isso, já há testes com composições maiores e até com biodiesel puro (B100). No fim de dezembro, a Amaggi anunciou a utilização de veículos aptos a rodar só com o biocombustível. Nesta semana, foi a vez da 3tentos, também do setor de grãos, anunciar uma parceria com uma transportadora, para abstecer um caminhão 100% movido à biodiesel.
Por Luciana Franco, Valor — São Paulo
Fonte: UDOP
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